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132 itens encontrados para ""

  • "As lições de cinema de Bong Joo-ho", no podcast Estúdio SEA

    Ouça a conversa de Jessica Gonzatto com o Estúdio SEA sobre as técnicas, poéticas e lições do autor sul-coreano Bong Joon-ho Em 2020, o mundo foi surpreendido pela avalanche de Oscars que o filme "Parasita" recebeu, impulsionando o diretor e roteirista sul-coreano Bong Joon-ho ainda mais longe em sua carreira internacional. No episódio #3 do podcast Estúdio SEA, o diretor e roteirista Gui De Lucca conversa com a também diretora e roteirista Jessica Gonzatto, co-criadora do Writer's Room 51, sobre o estilo e as técnicas de criação, direção e produção de Joon-ho. Como ele constrói imagens, ritmos e sentidos? De onde surgem algumas de suas ideias narrativas? Que aprendizados podemos tirar para nossa própria carreira no cinema? Confira isso e mais na entrevista! Ouça no Spotify Ouça no Apple Podcasts #entrevista #cinemacoreano #autor #diretor #roteirista #BongJoonho

  • O humor e a não-ficção, com Edu Araujo

    Autor do vídeo "Sudestino" (Porta dos Fundos) e roteirista do programa "Música Boa Ao Vivo" (Multishow), Edu Araujo fala sobre humor e processos na sua rotina criativa Nota da edição: essa entrevista foi feita enquanto Edu Araujo ainda fazia parte da sala fixa do Porta dos Fundos. Se você acompanha o canal do Porta dos Fundos no YouTube, com certeza se deparou com o vídeo “Sudestino”, que até a data de hoje (21/08/2021) reúne mais de 1,5 milhões de visualizações. Sucesso imediato, “Sudestino” coloca o dedo em uma ferida social muito aberta ao inverter o jogo e mostrar uma grossa camada de preconceitos que envolve a visão generalizada que muita gente do sudeste tem sobre o nordestino. Por trás do sucesso de “Sudestino” está Edu Araujo, roteirista potiguar com longa passagem pela publicidade e que, além de trabalhar desenvolvendo esquetes para o Porta dos Fundos, também se dedica a escrever projetos para canais como Multishow, Futura e Rede Globo. Araujo divide um pouco das suas múltiplas experiências profissionais, reflete sobre o ofício de escrever humor e destaca os desafios e prazeres do seu trabalho com não-ficção. Para quem não assistiu ao vídeo “Sudestino”, dá uma conferida no link abaixo: Quem é Edu Araujo? Para definir a sua relação com o ofício de roteirista, Araujo busca inspiração na obra do poeta Manoel de Barros: “Ele fala em escovar as palavras. Para gente que escreve imagens, pensar em escovar as palavras é algo muito bonito. Eu sou um operário, eu escovo as palavras todos os dias. Releio, reescrevo, brigo pela vírgula, pelo melhor advérbio. E também sei até onde dá para negociar”. - Edu Araujo Roteirista agenciado pela Condé+, vinculado a Associação Brasileira de Autores Roteiristas (ABRA) e Estrategista Criativo com mais de 15 anos de experiência em Comunicação, Edu Araujo já desenvolveu estratégias de conteúdo e comunicação para marcas como Coca-Cola, Bob’a, Shell, Rock in Rio, Red Bull e muito mais. No entretenimento, Araujo trabalhou em programas para canais como Multishow, Futura e Rede Globo, onde desenvolve projetos atualmente. Além de integrar a sala do Porta dos Fundos como roteirista fixo por 2 anos, o autor também escreve podcasts na Rádio Novelo. “Meu texto sempre foi bem humorado”, comenta Araujo, lembrando da época em que trabalhava com publicidade. De Natal, o roteirista se mudou para o Rio de Janeiro, onde fez sua Pós-Graduação e conquistou seu diploma em Jornalismo, um sonho antigo, mesmo antes de ingressar na Publicidade. “Comecei a trabalhar em 2012 no Rio de Janeiro. Passei por várias agências de publicidade, onde continuei trabalhando o humor nos meus textos”, contextualiza Araujo. Em 2013, começou a trabalhar para a Artplan, agência que cuida do evento Rock in Rio. Araujo destaca que “a música sempre fez parte da sua vida”, deixando claro que trabalhar para um evento de sucesso como o Rock in Rio foi um grande desafio, mas também uma experiência engrandecedora. Na época, Araujo se dedicava a trabalhar conteúdos para as redes sociais do evento. Segundo ele, “no tempo em que o Instagram ainda tinha borda”. Depois dessa experiência, Araujo passou a trabalhar na área de comunicação da Rede Globo. “Eu comecei a responder pelo @tvglobo, eu vivi por 4 anos o mesmo que um Palco Mundo do Rock in Rio todos os dias na Globo”, explica. “Você tem que saber se comunicar com o público da Fátima Bernardes, do Pedro Bial, da Malhação… Tem umas miudezas que vão te impulsionando criativamente”. - Edu Araujo Para Araujo, a agilidade é uma característica muito importante para quem se dedica a produzir conteúdo em redes sociais para grandes marcas (e grande público também). “É uma pressão enorme para ser criativo o tempo inteiro”, resume Araujo. “Acho que tudo isso me deu munição para a comédia. A comédia vem da observação do cotidiano, que é uma coisa que eu não abro mão”, Araujo reflete sobre a sua trajetória. De acordo com a sua visão, uma característica marcante do seu “estilo como roteirista” é justamente trabalhar as miudezas do cotidiano. Araujo entende que seu trabalho no vídeo “Sudestino”, do Porta dos Fundos, é um pouco o resultado disso. “Trabalhar com humor é colocar uma lente de aumento nas coisas”, resume. O humor na trajetória de Edu Araujo Edu Araujo afirma que até hoje, ao ver seu nome associado à palavra “autor”, sente o peso dessa responsabilidade. Seu ingresso no roteiro veio a partir de cursos de formação. Araujo destaca a Academia Internacional de Cinema como grande ponto de virada em sua vida. “Sou filho de professores, sou criança de humanas. Fui criado com muito livro, muito debate”, revela. “A gente que escreve é sempre o nota 10 na redação da escola. Aí você vai para o seu primeiro trabalho e fala: ‘meu Deus, eu encontrei os outros nota 10 aqui’”. - Edu Araujo “Quando a gente tá falando em humor em produção textual, estamos falando de tudo”, responde Araujo, sublinhando a importância das suas experiências criando conteúdo para marcas como Rede Globo e Rock in Rio. Para Araujo, “trabalhar com redes sociais em um grande evento da música como o Rock in Rio não significa apenas postar foto com frase de efeito”. O roteirista explica que era preciso entender a linguagem de cada artista. “Os fãs da Beyoncé falam de um jeito, os fãs do Iron Maiden, que se apresenta dois dias depois, falam de outro jeito. E eu tinha que me comunicar com todo mundo”, completa. Segundo Araujo, essa experiência já o ajudou muito a trabalhar a construção de voz e personagem. “Meus textos no humor tem muita raiva também. Eu tenho essa coisa do humor corporativo - eu adoro criticar chefe babaca em esquete. O mundo CLT, o mundo romantizado de trabalhar até tarde, do seu ‘propósito, essas coisas’”. - Edu Araujo A pandemia que vivemos certamente afetou a rotina e o processo criativo de Araujo, que se dedicou semanalmente por 2 anos a criar propostas de esquetes para o Porta dos Fundos. Entendendo sua função como “um cronista que precisa observar o cotidiano de perto”, Araujo não tem dúvidas de que os humoristas vão salvar o mundo. Afinal, depois de quase 2 anos de pandemia, tudo o que nos faz dar uma boa risada sem perder o tom apropriado é um grande remédio. Trabalhando no Porta dos Fundos Com o surgimento do Porta dos Fundos e seu sucesso estratosférico, muitos roteiristas começaram a se interessar por desenvolver premissas e esquetes engraçadas para a internet. Com esse desejo, naturalmente também surgem algumas dúvidas: como é trabalhar em uma produtora como o Porta dos Fundos? Como é a rotina de criação de um roteirista da empresa? Edu Araujo divide com a gente um passo a passo do seu trabalho no Porta. “Parece que quem trabalha no Porta, só trabalha para escrever as esquetes para o canal. O canal é um braço do Porta, mas o Porta dos Fundos é uma produtora de conteúdo. Tem várias outras plataformas do Porta para além do canal no YouTube”, afirma Edu Araújo, que fez parte do time fixo de dezembro de 2019 a agosto de 2021. Chefiada pelo roteirista Gustavo Martins e coordenada por Juliana Rodrigues, a sala de roteiro do Porta dos Fundos se reúne semanalmente para trocar material criativo e debater ideias de premissas coletivamente. “A gente debate ideias, temas que estão rolando naquela semana, mas também temas que você tem interesse”, resume Araujo. “Depois, na quarta-feira a gente se encontra para ler as esquetes que vamos apresentar na reunião geral da sexta-feira. Nessa reunião de quarta somente os roteiristas participam. Nós discutimos o que podemos melhorar em cada esquete”. - Edu Araujo A partir daí, os roteiristas trabalham um pouco mais em sua esquete, enviam as propostas para o chefe de roteiro dar sua opinião e partem para a reunião geral. Na sexta-feira os roteiros são lidos e debatidos pela equipe e sócios, incluindo Fábio Porchat, Gregório Duvivier, João Vicente, Antonio Tabet e Ian SBF. Araujo destaca o privilégio de ser lido por uma equipe tão competente (e engraçada) e reforça: “é uma produção em escala”. “A partir daí o processo é o seguinte: sua esquete pode ser aprovada imediatamente, o que acontece raramente, aprovada com ajustes e também tem o ‘volta’. O ‘volta’ é mais ou menos um: ‘beleza, gostamos da premissa, mas não é esse o texto ainda’. A partir daí a gente debate, testa a premissa com outras ideias e isso volta para a próxima reunião. Mas geralmente a gente não volta com o mesmo texto na semana seguinte porque o texto ainda tá muito fresco na cabeça das pessoas. E assim foi com o ‘Sudestino’”. - Edu Araujo Araujo revela que o texto da esquete “Sudestino” passou por cinco rodadas de leitura em reunião em um período de um ano e meio. Sobre o fato, o roteirista afirma: “eu acho isso muito legal do processo: a gente batalha pelo melhor texto”. Para quem pensa que aprovar uma esquete no Porta dos Fundos é um processo rápido, Araujo tem outra história para contar: “A primeira esquete que eu aprovei - eu entrei em dezembro de 2019 - foi só em fevereiro de 2020. Ela foi gravada, mas nunca foi ao ar. Tem esquete, como é o caso do ‘Novo Pantanal’, um assunto super quente, que eu fiz e já foi para o canal duas semanas depois. O Porta dos Fundos tem uma gaveta de projetos muito grande”. - Edu Araujo Como todo processo coletivo de criação, existem regras a serem seguidas. Araujo revela que no Porta dos Fundos a regra é não tecer qualquer tipo de comentário ou reação durante a leitura. “A única coisa que você pode fazer é rir, se quiser. Isso é para não influenciar na decisão depois”, explica. Ainda sobre o processo criativo da esquete, Araujo comenta que muitas pessoas ainda têm uma visão um tanto errada sobre sua criação. “Tem uma técnica para escrever esquete. As pessoas acham que escrever esquete é escrever uma cena. Na cena, por exemplo, eu já tenho personagem, eu já sei para onde eu vou levar o arco narrativo dessa personagem. É diferente escrever uma esquete. Às vezes você fica um dia inteiro em uma premissa e você não chega, ela não fica engraçada”, comenta Araujo, deixando bem claro que “nada é descartado ou apagado”. O roteirista de não-ficção Quem vê o trabalho de Edu Araujo no Porta dos Fundos talvez não saiba que ele também vem se dedicando bastante a programas de não-ficção. Entre suas experiências, é roteirista no programa “Música Boa Ao Vivo”, do Multishow. Como é ser roteirista de não-ficção, afinal, com o desafio de trabalhar o ao vivo? Araujo afirma que o melhor elogio que ele pode receber é “nem parece que tem roteiro, que tem algo escrito no TP (teleprompter)”. A transparência do trabalho como roteirista vai muito além do processo. “Isso ninguém conta - a gente reescreve muito”, comenta Araujo, que completa: “tem gente que acha que você escreve uma vez e pronto. A gente ensaia, a pessoa lê, muda a expressão, ensaia no palco, a pessoa sugere outra expressão, você reescreve… Isso deixa tudo muito bem afinado também”. Adaptar o texto a apresentadora ou apresentador em questão, sua forma de se expressar, o que ela representa, mantendo sempre o ritmo do programa - tudo isso faz parte do processo do roteirista de não-ficção para a TV. “Em não-ficção, lá fora eles chamam o roteirista de ‘writer producer’, um roteirista produtor. É um pouco isso. O roteirista precisa alocar os desejos de todo mundo. Em um programa musical, você precisa entender o repertório sugerido pela direção musical. Juntos, vocês definem os blocos de música a serem validados pela direção artística. Aquelas músicas fazem sentido juntas para contar uma história. Você também tem que atender aos desejos do artista, os desejos do casting, os desejos do canal.” - Edu Araujo Edu Araujo resume muito bem a questão: “todo roteiro é técnico, mas o roteiro de não ficção é mais técnico ainda”. Isso faz muito sentido, uma vez que o roteiro de não-ficção precisa atender a tantas necessidades, mas também se tornar um documento de fácil compreensão por toda a equipe, que precisa ser extremamente ágil. “Se alguém não entender o seu roteiro, você não fez o seu trabalho”, resume o ponto. Edu Araujo destaca a realidade do trabalho em programas de não-ficção, principalmente aqueles exibidos ao vivo: a pessoa roteirista precisa ser dinâmica, saber ter jogo de cintura para adaptar o conteúdo de última hora e ter uma boa habilidade para trabalhar em equipe. Um trabalho que, por si só, parece contrariar bastante a ideia livre e fluida do seu processo como roteirista de esquetes. A questão é que Edu Araujo se desenvolve como roteirista exatamente entre esses dois pontos: do processo de observação à dinâmica da troca. O ensinamento que ele deixa aqui, acima de tudo, é que existe um lugar onde a esquete de humor e o trabalho com não-ficção se encontram. Esse ponto é o “saber ouvir”. Independente do formato, o trabalho do roteirista solitário que escuta apenas as vozes da própria cabeça se apresenta quase como um mito. Para Araujo, o time que compõe o trabalho é parte do que vai ajudá-lo a “escovar as palavras”. #roteiro #roteirista #PortadosFundos #RedeGlobo #Multishow #humor

  • 'Doutor Gama': escrevendo biografia com Luiz Antônio

    O roteirista nos conta sobre o processo de escrita, pesquisa e produção da biopic "Doutor Gama" (2021) No dia 05 de agosto de 2021 chegou às salas de cinema o filme biográfico "Doutor Gama", com roteiro de Luiz Antônio, direção de Jeferson De e coprodução da Globo Filmes e Paranoid, além da produção associada da Buda Filmes. Inspirado na vida do advogado abolicionista Luiz Gonzaga Pinto da Gama, uma das figuras mais importantes da história brasileira, "Doutor Gama" apresenta uma personagem forte em sua jornada em busca de liberdade e conhecimento. Graças a todo o seu desenvolvimento intelectual, Luiz Gama utilizou as leis e os tribunais para libertar mais de 500 pessoas escravizadas, se tornando um dos mais respeitados advogados de sua época. Por trás dessa história inspiradora, entre tantos outros profissionais, está o roteirista Luiz Antônio, que por anos se dedicou a destrinchar a vida de Luiz Gama entre diversas páginas de roteiro. Conversamos com Luiz Antônio para entender, em detalhes, o histórico do projeto, sua importância e desafios, além de refletir sobre a feitura de um roteiro biográfico. Se interessou pelo filme? Confira o trailer a seguir: Da ideia às telas de cinema "É um projeto pessoal (ou pelo menos se inicia assim)", afirma Luiz Antônio, destacando que o desenvolvimento do projeto surgiu em um momento em que o roteirista se dedicava a dar aulas e pesquisar o apagamento de locais e personagens negros na cidade de São Paulo. Segundo Antônio, o autor já acumulava uma extensa pesquisa sobre a vida da população negra nas Américas entre o século XIX e o começo do século XX. "Quando Luiz Gama chegou a mim, fiquei fascinado e quis me aprofundar. Mesmo com o esforço incansável e brilhante trabalho acadêmico da Professora Ligia, e de reivindicações de setores do Movimento Negro, Luiz Gama não era nome popular em 2010", reflete Antônio, deixando claro que foram onze anos desde o roteiro escrito até o filme ganhar as telas. "Tempo de muito trabalho, principalmente para a viabilização", completa. "Nos primeiros quatro anos, um processo quase solitário, a não ser por poucas pessoas que me incentivavam, quase todas de fora do cinema. Pouquíssimos queriam ler (menos ainda pensar produzir) a história com protagonista negro e seu entorno também negro, esse homem preto que se assume como tal, altivo e se fazendo respeitar, íntegro, sagaz, dono de sua própria voz, atuando como intelectual profundo". - Luiz Antônio Heitor Dhalia, da Paranoid, é citado por Antônio como um dos profissionais que imediatamente compreenderam o valor da história de Luiz Gama para o cinema, além da importância de montar uma equipe talentosa, competente e engajada com a mensagem que o filme se propõe a passar. "Começa-se a montar essa equipe negra. Ele [Dhalia] foi fundamental para o encontro do roteiro com o diretor, Jeferson De, que eu conhecia pelas obras 'Bróder' e 'Carolina'", comenta Luiz Antônio. Outra figura importante que batalhou pelo filme, segundo Antônio, foi Pedro Betti, também da Paranoid, que divide a produção com Heitor Dhalia, Egisto Betti e Manoel Rangel. Joelma Gonzaga também teve peso importante no roteiro. Se o roteiro de "Doutor Gama" encontra um fascinante ponto entre a representação história e a poesia, esse quadro é extremamente valorizado pelo belíssimo trabalho de direção de Jeferson De. Entre diálogos precisos, podemos desfrutar também de paisagens muito bem enquadradas e uma reconstrução histórica de digna de grandes produções. "Essa força coletiva fez o filme acontecer, cada pessoa trazendo conhecimentos e talento. E se é mais que um projeto pessoal, é porque faz parte de uma luta coletiva de gente que abriu caminho na sociedade e no mundo das artes, por décadas, para um filme como esse existir". - Luiz Antônio Luiz Antônio destaca a importância de contar com um elenco de primeira para dar vida a suas personagens multifacetadas. Entre as estrelas do filme, estão Mariana Nunes, César Mello, Sidney Santiago, Samira Carvalho, Romeu Evaristo, Teka Romualdo, Johnny Massaro, Erom Cordeiro, Dani Ornellas, Alan Rocha, Higor Campanaro, Isabel Zuaá e tantos outros profissionais. As responsabilidades e desafios do roteiro biográfico Para Antônio, "Doutor Gama" nunca foi apenas um projeto. O roteirista reflete sobre o que o move na hora de escrever suas obras: "Uma vez, escutei: 'se for escrever um roteiro por conta própria, projeto pessoal, que seja um filme pelo qual você ficaria a noite toda acordado esperando a estreia, um que você gostaria de ser o primeiro a ver. Porque você vai passar por tanta coisa com esse roteiro, que só assim vai valer a pena.' É um roteiro que busca excelência técnica e de linguagem, entreter e emocionar, mas é muito mais". - Luiz Antônio Antônio deixa claro a importância do trabalho "de mostrar que não tivemos escravos como vemos usualmente nas telas, mas sim pessoas escravizadas, algumas brilhantes". A mente brilhante de Luiz Gama é muito bem destacada pelo roteiro, que nos apresenta sua personagem protagonista justamente através da sua busca pelo conhecimento que liberará não só a si, mas a muitas pessoas. Para Antônio, outra função da obra é também mostrar que certas pessoas que praticavam esses crimes, convivendo normalmente com a escravidão, "não eram necessariamente vilãs de filmes e novelas". "O audiovisual reflete o racismo do Brasil. Quantos Luiz Gamas o Brasil e o mundo perdem por dia?", indaga Luiz Antônio. Segundo o roteirista, "escrever uma biografia para a tela não é tão diferente de uma criação livre". Afinal, trabalha-se regras de drama e estruturas universais. Para ele, é preciso "entender com intimidade como funciona o tempo e espaço da história que vai contar, conhecer bem seus personagens e criar relações entre eles, ter protagonista bem definido com objetivos e motivações, entender os desafios que atrapalham ele nessa busca. Saber quem é o antagonista, como ele age", resume. Apesar disso, Antônio afirma que não podemos cair na falsa impressão de que, por ser baseada em fatos reais, a biografia já "conta com um argumento pronto". Os fatos devem ser respeitados ao máximo e as intenções dos personagens históricos mais ainda, mas o recorte que o autor dá pode criar diferentes roteiros, que levarão a diferentes experiências dramáticas e, consequentemente, distintas histórias humanas. Essa mesma história de "Doutor Gama", sendo protagonizada por Claudina, sua esposa, resultaria em outro roteiro, outro filme, mesmo seguindo o mesmo tempo histórico e os mesmos fatos". - Luiz Antônio É impossível resumir a pluralidade de toda uma vida em poucas horas de filme. Naturalmente, como parte do processo, Antônio revela que precisou fundir figuras histórias "e até mesmo épocas que tinham o mesmo 'papel' na jornada da protagonista". "Tudo sem esquecer o fundamental: não adianta pesquisa, técnica e estudo sem entender como seu protagonista e as outras personagens reagiriam e reagem em cada situação. Isso mostra quem eles são. O lado humano. Emoção", completa Antônio. Falando em adaptações, Luiz Antônio tem uma longa história para contar sobre o roteiro, que já chegou a ter perto de 150 páginas. O roteiro: adaptações, reduções e o papel do coletivo "Por incrível que pareça, nos Estados Unidos o roteiro teve mais receptividade que aqui, até certo momento", afirma Luiz Antônio. Acreditando no caráter universal da historia, Antônio chegou a trabalhar uma "última versão" em inglês, uma vez que havia notado um interesse muito maior vindo do Hemisfério Norte. Essa versão em inglês, já um pouco maior do que o usual, contava com 121 páginas. Antônio revela que o tamanho do roteiro não causou espanto em ninguém, dividindo que a versão em português que conquistou a atenção de parceiros aqui no Brasil já tinha 148 páginas. "Tenho que admitir que, depois de 4 anos, já estava quase desistindo, e me faltava incentivo para mais um tratamento. Decidi manter o tamanho, prevendo futuras alterações que o roteiro sofreria com uma possível visão de diretora ou diretor e produtores. Não podia mais trabalhar sem ter garantia mínima da existência do filme, não tinha mais possibilidades de dedicar ainda mais tempo sem certeza de que algo aconteceria". - Luiz Antônio Segundo Antônio, o tamanho do roteiro correspondia diretamente com a necessidade narrativa que a vida de Luiz Gama pedia. "Para atingir o maior número de pessoas com a mensagem forte que o filme traria, o roteiro pedia formato clássico, quase épico, estruturado de maneira próxima do tradicional. Ainda assim, não aceitaria reduzir personagens a estereótipos", destaca Antônio, afirmando que parte da sua missão era "fazer com que o lado humano do protagonista (dores, amor, ideais) conduzisse o leitor (e depois o expectador)". A chegada da Paranoid e a escolha do diretor Jeferson De certamente influenciou criativamente nesse processo, principalmente para entender como o diretor colocaria de pé as páginas escritas por Luiz Antônio. Encontrando a unidade da história "Se toda vida tem pluralidade, a de Luiz Gama consegue ser ainda maior. Cada faceta dele daria um filme próprio", reflete Antônio, que menciona também a responsabilidade em honrar esse "Luiz Gama histórico". Antônio cita a escritora norte-americana Toni Morrison como inspiração para trabalhar o ponto de vista das suas personagens negras, "sem utilizar o olhar 'de fora'". "A escolha sempre foi a de mostrar a humanidade de Luiz Gama, suas conquistas, seus amores, e sim suas dores (sem explorá-las de uma forma voyeurística, gratuita, sádica). Tudo de uma maneira que falasse com o público, e não apenas o cinéfilo acostumado a ousadias audiovisuais", reflete Antônio. Para manter sua estrutura quase épica de narra essa história, Antônio buscou recortes representativos da vida de Luiz Gama que não caíssem na ideia de white gaze (conceito que apresenta a suposição de que o leitor ou espectador parte sempre da perspectiva de alguém que se identificado como pessoa branca). "A perda da mãe (e sua eterna busca) e de muitas figuras femininas que o adotam e influenciam ao longo da vida; a injustiça e crime imperdoável que é o escravizar; a sede de conhecimento, simbolizada pela leitura (sem diminuir o conhecimento oral); o entendimento da brutalidade e selvageria dos ricos, brancos e poderosos; o uso e abuso das leis contra camadas específicas da população; a hipocrisia de “pessoas de bem”; a influência e respeito a diferentes formas de luta, essenciais; a luta pela liberdade", destaca Luiz Antônio. O papel fundamental da pesquisa Uma obra biográfica necessariamente vai envolver muita pesquisa. Aí, é importante saber onde pesquisar. "O trabalho da professora Ligia Fonseca Ferreira é fundamental para o conhecimento de Luiz Gama. Não sou do mundo da academia, mas acredito que nenhuma outra acadêmica conviveu tão profundamente e com tanto rigor e respeito com o genial Luiz Gama", reflete Antônio. O roteirista afirma que a maior parte da sua pesquisa para o roteiro foi iniciada mesmo antes de surgir a ideia do projeto. "Acumulei fotografias, ilustrações, livros de historiadores. O final do século XIX e começo do século XX é período chave para a nossa nação em muitos aspectos, com a consolidação, riqueza, resistência e a criminosa perseguição violenta da cultura e religiosidades brasileiras de matrizes africanas (aspectos fundamentais para mim) e nossa formação sociopolítica dita “moderna”, que é opressora e racista, nascida na eugenia. No meio dessas leituras, encontrei doutor Luiz Gama e, ao descobrir alguns trabalhos da Professora Ligia, no mesmo momento entendi que ali estaria a fonte para chegar ao homem Gama". - Luiz Antônio Para Antônio, "uma das coisas importantes que o filme pode fazer é estimular pessoas a lerem Luiz Gama", trazendo os livros "Com a Palavra, Luiz Gama" (org. Ligia Fonseca Ferreira, 2011) e "Lições de Resistência" (Ligia Fonseca Ferreira, 2020) como fontes essenciais. Para completar, a própria escolha do título definitivo da obra partiu do princípio de honrar essa emblemática figura da nossa história. "Como me disse depois a própria Professora e também Doutora Ligia: 'se Luiz Gama, esse intelectual tão brilhante, jurista, jornalista, pensador, poeta, homem admirado e honrado, se ele não não foi um Doutor, quem é doutor nesse país?'". - Luiz Antônio "Doutor Gama" é muito mais do que um retrato histórico do advogado abolicionista. Trata-se de uma importante obra para refletirmos, através da sua história, os rumos do nosso país e o nosso papel nisso tudo. Se vivemos um período sombrio no Brasil, precisamos, mais do que nunca, tratar histórias como essa, de Luiz Gama, com responsabilidade e apelo para grande público. #filme #DoutorGama #audiovisual #biografia #entrevista

  • Prêmio Selo Elas Cabíria Telecine 2021 irá selecionar melhor argumento de comédia

    Com foco em autoras mulheres, o argumento vencedor ganha um contrato de produção e distribuição com a Elo Company e um orçamento de desenvolvimento no valor de R$ 200 mil Nesta edição de 2021, o Cabíria Festival - Mulheres & Audiovisual, a Elo Company (através do Selo Elas) e o Telecine se unem em uma iniciativa pioneira para premiar um argumento de comédia, que receberá um contrato de produção e distribuição com a Elo Company, além de R$ 200 mil para o desenvolvimento do roteiro. Através do site do Cabíria Festival (cabiria.com.br), roteiristas mulheres de todo o país poderão inscrever seus argumentos de comédia. A curadoria, então, selecionará cinco argumentos finalistas e, no dia 06 de outubro de 2021, anunciará o projeto vencedor durante evento online de abertura do Cabíria Festival. "Ficamos muito felizes com a parceria com Cabíria e Telecine em 2020. Este ano decidimos ampliar o prêmio, contemplando um argumento de comédia, com perfil mais comercial, para alavancar as roteiristas em um nicho de mercado ainda muito ocupado por roteiristas homens. Ano passado, os roteiros fizeram parte de edições anteriores do Prêmio Cabíria e agora damos oportunidade a toda e qualquer roteirista que queira participar. O projeto vencedor de 2020, 'Avenida Beira-Mar’, que faz parte do Selo Elas, em breve será lançado e distribuído pela Elo Company”, conta Paula Garcia, Head de Produção da Elo Company. “A criação do Cabíria Prêmio de Roteiro, em 2015, colocou em pauta três objetivos principais: estimular histórias com protagonistas inspiradoras; converter o prêmio em um selo de qualidade para os roteiros ampliando suas oportunidades junto ao mercado; e contribuir para a visibilidade de roteiristas mulheres, em busca da redução da alarmante disparidade de gênero no audiovisual. Portanto, conquistar a parceria com agentes tão relevantes da cadeia produtiva, como a Elo Company e o Telecine, é motivo de grande comemoração por representar o avanço e a qualificação desses objetivos”, declara Marília Nogueira, idealizadora do Prêmio Cabíria. “O Prêmio Selo Elas Cabíria Telecine 2021 promove e fomenta o protagonismo feminino no audiovisual, o que é um objetivo contínuo nosso, como hub de cinema. Ficamos muito felizes de sermos parceiros de marcas tão alinhadas ao nosso propósito”, afirma Cristina Cadore, Diretora de Marketing e Produto do Telecine. O Selo Elas é uma iniciativa da Elo Company que oferece mentoria com reconhecidos profissionais do mercado para projetos de longas-metragens dirigidos por mulheres, como forma de ajudar a equilibrar a participação feminina no mercado audiovisual. A iniciativa está no quarto ano de mentoria, já atendeu 37 projetos. Uma rede formada por 23 profissionais experientes do mercado audiovisual (das áreas artística, executiva e jurídica) colaboram em consultorias dos projetos buscando potencializar seus resultados e olhar de suas diretoras quanto ao mercado. Quer saber mais sobre o projeto? Confira a nossa entrevista com Barbara Sturm, Diretora de Conteúdo da Elo Company e criadora do Selo Elas. "Nos últimos anos, a mulher tem se entendido na sociedade como consumidora e dona das suas decisões e escolhas, e demanda por conteúdos onde se vê como protagonista, com histórias que poderia viver e heroínas que gostaria de ser, e isso demanda um espaço ainda pouco ocupado no cinema brasileiro, onde menos de 20% dos filmes lançados anualmente são escritos ou dirigidos por mulheres”. - Barbara Sturm (Diretora de Conteúdo da Elo Company e criadora do Selo Elas) O Cabíria Festival - Mulheres & Audiovisual chega na sua terceira edição, que ocorre de forma totalmente online entre os dias 06 e 17 de outubro de 2021. Serviço: O período de inscrições é de 09 a 22 de agosto, mediante taxa no valor de R$90. Roteiristas mulheres PcD, negras, indígenas e pessoas trans poderão requisitar gratuidade nas inscrições, via formulário simplificado de autodeclaração, conforme regulamento. Acesse o regulamento e formulário em www.cabiria.com.br #CabíriaFestival #EloCompany #SeloElas #Telecine #prêmio #roteiro #desenvolvimento

  • 7 dicas fundamentais para escrever grandes vilões

    Precisa de ajuda na construção de uma boa personagem antagonista? Quer desenvolver ainda mais seu vilão? Leia nossas dicas! Uma das principais forças motrizes de qualquer história é o conflito - e você não pode ter um grande conflito sem grandes vilões ou oponentes. Embora seja verdade que todo tipo de personagem precisa ter sua própria luta, sua principal fonte de atrito contínuo será a dinâmica entre "herói" e "vilão", mesmo que isso seja simbólico. Portanto, saber como escrever oponentes é fundamental para a sua história. Infelizmente, roteiristas de todo lugar caem na armadilha de escrever vilões que fracassam. Tais personagens existem apenas para lutar contra a protagonista, suas motivações são clichês e suas reações, previsíveis. Mas então, como você escreve um grande vilão ou vilã? O que os torna memoráveis ​​e poderosos? Enquanto você desenvolve suas personagens, pense nessas dicas que traduzimos e adaptamos do Writing Cooperative e do blog do Arc Studio Pro! Como desenvolver boas personagens (em geral)? Personagens são com quem o leitor se identifica. É muito bom ter um enredo sólido, mas ninguém vai continuar assistindo se as personagens forem chatas. Mistérios são divertidos, mas ninguém pode negar o efeito que Poirot tem sobre a diversão da história, não importa quão inteligente seja a reviravolta. Poirot é grande parte do motivo pelo qual as pessoas amam Agatha Christie. "Pode ser possível apresentar personagens com sucesso sem contar uma história, mas não é possível contar uma história com sucesso sem apresentar personagens: sua existência, como realidades reconhecíveis, é a única condição sobre a qual a história pode ser efetivamente contada." - Wilkie Collins Então, para criar personagens primárias e secundárias que não apenas ajudem, mas aprimorem o enredo, a cada personagem que você cria para sua história, você pode perguntar: qual é o seu propósito aqui? Esta pergunta o ajudará a descobrir o aspecto técnico da criação do personagem. Se uma personagem não fizer nada para afetar o enredo, corte-a sem medo, mesmo que seja sua ideia de antagonista. Lembre-se de que existem muitas maneiras pelas quais as personagens afetam a história e nem todas são óbvias. Existe uma boa ferramenta para organizar tudo isso. John Truby, em seu livro 'The Anatomy of Story', diz que "um real oponente não só quer impedir o(a) herói(heroína) de alcançar sua objetivo como também compete pelo mesmo objetivo". Aí, ele lembra que a coisa mais importante a lembrar ao escrever personagens é que todas fazem parte de uma "teia de histórias". Como elas funcionam em sua história está ligado ao arquétipo de sua personagem, se elas são 'o rebelde', 'a mãe', 'o mentor', 'o guerreiro', 'o trapaceiro', etc. e como esse arquétipo se conecta à sua protagonista. Depois de decidir em qual arquétipo uma personagem se encaixa e, portanto, em qual função elas atuam na história, você pode ver se sua existência é realmente necessária para conduzir sua história à conclusão. Por exemplo: sua protagonista realmente precisa de um ajudante? Você poderia responder 1) sim, porque é co-dependente/não possui o conjunto de habilidades para fazer isso sozinha, etc. ou 2) não, ela não precisa um ajudante porque na verdade é mais solitária/tem problemas de confiança/possui as habilidades para fazer tudo sozinha, etc. Assim, construa também sua personagem antagonista com base nos mesmos preceitos e com base no tema. Qual lado ela representa? Como está interligada com a protagonista? Desenhe uma teia de personagens e escreva como elas estão ligadas umas às outras e também aos pontos mais importantes da trama. Este tipo de "mapa" vai ajudar a ter clareza sobre como manter a história em movimento e quem deve movê-la em qual direção. Depois de saber por que uma personagem existe, você pode começar a desenvolvê-la pensando em como chegou nesse lugar e a pessoa que ela é no início de sua história. 7 dicas para criar boas personagens antagonistas 1. Grandes vilões também são gente (quando são) Pessoas são complexas. Possuem todos os tipos de falhas, peculiaridades e relacionamentos. As personagens vilanescas não são diferentes. Isso não significa que precisamos bombardear o roteiro com todas as suas implicâncias, mas saber como é sua personalidade completa é crucial. Dessa forma, quando um momento relevante nos dá a oportunidade de trazer um toque de cor para suas ações ou diálogo, podemos fazer isso. Todos nós temos paixões e desejos e eles influenciam a forma como reagimos ao meio ambiente e às outras pessoas. Um grande amor pela música clássica pode fazer alguém inclinar a cabeça ao ouvir sua música favorita no elevador ou sentir empatia pela garota que toca violino no metrô. Mesmo um vilão desconhecido e arquetípico precisa ter uma personalidade, ainda que seja pouco revelada. Muitas vezes, aqueles poucos momentos de humanização servem como um contraste gritante com outro em que se comportam de maneiras distintamente desumanas. Pode parecer estranho dizer 'conheça sua personagem o melhor que puder, mas não torne isso tão pessoal', mas como Graham Greene aponta, permitir que elas cresçam ajudará a torná-las independentes e, portanto, mais úteis na sua história. "Protagonistas [...] devem necessariamente ter algum parentesco com o autor, saem de seu corpo como uma criança sai do útero, então o cordão umbilical é cortado e eles crescem em independência. Quanto mais o autor conhece dele, quanto mais ele se distanciar de seus personagens inventados, mais espaço eles terão para crescer". - Graham Greene Isso vale também para bons vilões! Ame suas personagens. Compreenda-as. Mas nunca se esqueça por que estão lá. Só porque você ama o quão peculiar e incompreendido o Coringa é, não significa que ele ainda não iria se envolver em uma onda de assassinatos. Você precisa que eles tenham independência de seus próprios valores morais para que possam cumprir seu propósito criativo. 2. Grandes vilões representam coisas maiores Às vezes, no sentido prático, uma personagem vilã representa mais do que apenas seu próprio ganho pessoal. Elas representam anarquia, vingança ou simplesmente um conjunto diferente de linhas éticas daquelas que sua protagonista traça. Outras vezes, um vilão se apresenta como um representante metafórico de nossos próprios medos e paranóia. Eles representam o “outro”. Frequentemente, os medos que simbolizam mudam junto do momento em que são criados; sejam invasões, guerras nucleares, aquecimento global ou radicalização política. Finalmente, no sentido literal, um grande vilão pode ser mais do que apenas uma pessoa: uma entidade, um grupo, um poder, um exército, uma doença, uma ameaça que não é identificável como uma única personalidade. Seja qual for o caso, uma personagem antagonista forte significa mais do que apenas a ameaça imediata de sua presença sempre tem um impacto maior. 3. A motivação da antagonista não é uma linha reta É fácil cair em certos padrões ao escrever vilões - um dos mais frequentes é traçar uma linha reta entre um evento de seu passado e suas ações no presente. Alguém assassinou seu ente querido, por isso buscam vingança. Alguém os feriu, portanto querem se vingar. Não foram amados quando crianças, portanto, gostam de matar. Embora essa linha reta possa ser um bom ponto de partida, a vida nunca é tão simples. As coisas atrapalham, as motivações múltiplas interagem umas com as outras e se complementam ou se contrapõem. Além disso, as pessoas mudam. Ao escrever uma personagem vilã, tente considerar que ela sempre vai querer mais de uma coisa por mais de um motivo - e muitas vezes fica em conflito sobre qual objetivo perseguir em qualquer cenário. 4. 'Vilão' nem sempre significa 'bandido'! Pense na personagem como oponente Estamos acostumados a pensar em termos simples: o cara bom e o cara mau. Mas, na realidade, pode ser muito mais complexo do que isso. Os melhores vilões são os heróis de sua própria história e não há razão para que você não possa mostrar essa história ao seu público também. É possível que, a princípio, seus objetivos e motivação estejam em conflito com seu herói. Mas os objetivos e a motivação mudam com o tempo, não é? Nós descobrimos mais backstories, vemos como oponentes se comportam em situações extremas e é aí que uma antagonista pode facilmente se transformar em algo mais. Pense na história da vilã de sua própria perspectiva. Aí, não importa para onde a história vá, você não corre o risco de escrever uma antagonista que é simplesmente "má". 5. Um grande vilão se destaca Existem muitas maneiras pelas quais um vilão pode se destacar da multidão e um vilão realmente excelente geralmente o fará em mais de uma. Embora seja verdade que ser "especial" é um estereótipo usado em demasia quando se trata de heróis, os vilões muitas vezes vão na outra direção, algo menos interessante. Personagens vilãs memoráveis se destacam não apenas por suas ações e princípios, mas pelo fato de terem objetivos especiais e uma capacidade especial de alcançá-los. Elas podem ser hiper inteligentes, possuir hiper recursos, uma hiper concentração ou simplesmente se destacarem por não seguirem as mesmas regras que todos os demais respeitam. Lembre-se de que as personagens mais cativantes são aquelas que vivem a favor de suas vontades ou fazem coisas que nunca faríamos na vida real. É por isso que vivemos através das personagens e admiramos, repudiamos ou sentimos emoções em relação a elas. Isso vale muito para vilões, já que frequentemente (e idealmente) essas personagens vivem realidades diferentes das nossas. Muitos de nossos vilões favoritos têm características facilmente reconhecíveis - pense na Malévola, Hannibal ou Darth Vader. Eles têm gostos muito peculiares e padrões de fala particulares. Todos esses elementos únicos se combinam para torná-los inesquecíveis. 6. Vilãs e vilões também têm que ganhar Então você desenvolveu sua personagem antagonista. E agora? O próximo passo é ver como elas se integram ao seu enredo. Uma coisa importante, mas fácil, que você pode fazer para garantir que seu vilão tenha impacto é deixá-lo vencer. Sejam grandes vitórias ou pequenas conquistas espalhadas ao longo do caminho, sua personagem vilã simplesmente não será uma grande ameaça se seus planos nunca derem certo. 7. Nós amamos vilões que nos surpreendem Possivelmente o item mais difícil da lista, um grande vilão precisa ser capaz de nos fazer pular da cadeira. A previsibilidade é a ruína da emoção, bem como contraproducente para dar ao seu herói ou heroína desafios dinâmicos a serem superados. Uma ótima maneira de ter certeza de que você está colocando surpresas em seu roteiro é perguntar ao seu Núcleo Criativo ou o que esperam que aconteça a seguir e ir contra essas expectativas (de uma maneira criativa e que faça sentido). As surpresas podem surgir de várias formas, desde golpes inesperados até momentos de gentileza e humanidade. Tais momentos nem sempre precisam ser planos complexos e bem pensados. Às vezes, as reações instintivas mais simples são o que deixará seu público surpreso. #personagem #vilão #vilã #oponente #antagonista #dicasderoteiro #dicas #narrativa

  • A personagem no divã, com Jaqueline Vargas

    A roteirista de "Sessão de Terapia" e "Malhação" revela como a psicanálise e observação ajudam na construção de personagens complexas e intrigantes Roteiristas tiram inspiração das coisas mais variadas - medos, tragédias pessoais, família… E uma grande fonte de inspiração são as dificuldades da vida, analisadas sob a abordagem da terapia psicanalítica. Entre muitos outros, cineastas como Andrei Tarkovsky e David Lynch notavelmente se inspiraram em conceitos psicanalíticos para realizar seus filmes, alguns até junto de uma autoanálise. E quem não se lembra das icônicas sessões de terapia em "Família Soprano"? Ou então, da série de sucesso "Sessão de Terapia"? Dirigida por Selton Mello, a série escrita pela roteirista Jaqueline Vargas é original da Globoplay, produzida pelo GNT e Moonshot Pictures. As duas primeiras temporadas de "Sessão de Terapia" foram adaptadas do original israelense "BeTipul", de 2005. A partir da terceira temporada, Jaqueline Vargas, Roberto d'Avila e Selton Mello desenvolveram temporadas inéditas. A quarta temporada, início da parceria com a Globoplay, rendeu o título de uma das séries originais mais vistas pelo público. Para investigar como construir personagens complexas, que lidam com problemas e questões psicológicas mais delicadas, conversamos com a autora, roteirista e psicanalista Jaqueline Vargas sobre sua experiência escrevendo a quinta temporada de "Sessão de Terapia". Confira! Quem é Jaqueline Vargas Formada em artes cênicas e em educação e reeducação psicomotora, Jaqueline Vargas é conhecida por seu trabalho na novela "Floribella'' (2005) e pela adaptação da série israelense "BeTipul - Sessão de Terapia" para o Brasil, que foi nomeada Melhor Série de Ficção TV Fechada/Ott de 2020 pela Academia Brasileira de Cinema. Trabalhou no SBT em 2009, na qual foi co-autora da novela "Vende-se um Véu de Noiva''. Em 2015, foi co-autora da décima quinta temporada de "Malhação", 'Malhação: Múltipla Escolha'. Em 2016, foi colaboradora de Renato Modesto na novela "A Terra Prometida" da RecordTV. Foi colaboradora da vigésima quinta temporada de "Malhação", intitulada 'Viva a Diferença'. Em 2020, Jaqueline criou a série de suspense ficcional "#tdvaificar", lançada em formato de podcast, e tornou-se autora de “Aquela que Não É Mãe”, livro de poesias lançado pela Buzz Editora em 2021. Construindo a personagem em terapia Idealmente, é a personagem quem vai conduzir a trama. Por isso, já trouxemos aqui várias dicas sobre construção de personagens complexas, intrigantes e ainda assim universais. Para construir personagens que fazem parte de um universo clínico, Jaqueline Vargas afirma que é fundamental ler intensamente e estudar os temas a serem tratados. "Muito vem do que me intriga e do que eu gostaria de entender melhor e, outra parte, vem de observar e escutar demandas de outras pessoas", afirma. Para abordar pacientes que trazem temas delicados, como traumas e distúrbios, Vargas faz "um leque grande de opções de possíveis pacientes/personagens", sempre partindo da pesquisa - um dos pontos mais importantes quando tratamos de uma abordagem clínica ou especializada. Essa é a maneira mais garantida de fugir dos clichês, estereótipos e até mesmo mentiras sobre condições e doenças. Mas, afinal, em que pontos a experiência da roteirista como psicanalista auxilia na construção narrativa? Vargas pontua: "É importante, mas não pode ser fundamental e não é". Para ela, "tudo é feito com licença poética e não deixa de ser entretenimento". "O que quero colocar é que não penso a série como psicanalista ou terapeuta e sim como escritora. Muito do que o personagem traz é subtexto para o roteiro e nem é nomeado na série." - Jaqueline Vargas Quando construímos personagens que carregam traumas ou distúrbios, é essencial não esquecermos de que ainda se trata de uma narrativa. Por isso, personagens ainda precisam ter falhas, forças e também completar algum arco narrativo. Por mais carismático que seja, Tony Soprano ainda possui sérios desvios de caráter, já que se utiliza da violência como meio de atingir objetivos ou, então, falha em cumprir seu papel como pai de família. Ainda assim, entendemos muito de sua personalidade ao revisitarmos sua infância, seus medos e conhecer o jeito como a vida molda suas crenças. Vale inspirar-se em si mesmo como pessoa quando escrevemos esse tipo de personagem? Para Vargas, "A maneira como todo roteirista escreve sempre deixa transparecer seu sintoma. Penso que tento usar a favor da narrativa". Não é sempre mais rico quando uma narrativa parece 'vivida'? Inspirar-se em seus próprios medos, anseios e experiências pode trazer exatamente esse tipo de característica para a sua história. "Se algo da minha vivência, do meu trajeto pode enriquecer a dramaturgia eu me aproprio sim. Os cuidados maiores são de sempre ter em mente que estou contando uma história e não estou fazendo escrita terapêutica. Não é sobre a minha falha dramática ou a minha pessoa, é outro universo para o qual empresto experiências pessoais que considero ter eco nas experiências do espectador." - Jaqueline Vargas Temas delicados: como abordar? Dentre outros aspectos, a personagem que mais cativa é aquela que traz contradições e características únicas, interessantes. Assim são também as narrativas mais cativantes: universais, mas que trazem aquele "toque" especial e específico. Muitas vezes, o que nos atrai como roteiristas são temas mais delicados. Em "Família Soprano" (1999), por exemplo, vemos muito da discussão do papel do homem e da mulher na sociedade, ou então dos limites éticos das relações entre analista e paciente. Em "Sessão de Terapia", vemos traumas pesados, dificuldades familiares, transtornos alimentares e outras questões sensíveis de se lidar. Vargas não se intimida com isso. A depressão pós-parto, por exemplo, é um dos temas importantes que a série trata. Para a roteirista, essa questão sempre a intrigou e ela pôde "presenciar o quão difícil e delicado esse momento pode ser para a mãe e para o bebê". Através da pesquisa e observação, Vargas constrói a personagem Manu (Letícia Colin), que sempre quis ser mãe, mas teve seu sentimento alterado quando isso se concretizou. Esse tema também é presente em "Precisamos Falar Sobre o Kevin" (2011), por exemplo, onde a protagonista é construída de forma tridimensional e o tema é explorado a partir de alguns ângulos. Essa exploração, inclusive, é outra ferramenta poderosa na hora de abordar temas difíceis. Experimente discuti-los sobre vários pontos de vista! Agora, se você ainda tem receio, vá pelo lado mais sutil. Que tal colocar a questão no pano de fundo? Em "Sessão de Terapia", Vargas usufruiu dessa abordagem ao tratar da pandemia do COVID-19, por exemplo. "Decidimos não carregar a mão na pandemia, por ser um tema delicado. Também não sabíamos como o planeta estaria diante da pandemia no momento da estreia da série", conta. "Logo, decidimos optar por um futuro onde a pandemia estivesse mais controlada e a vida começando a voltar a uma certa 'normalidade'. O que não deixa de ser inspiracional e representar um desejo geral". Na quinta temporada da série, os temas que têm relação com a pandemia são o burnout sentido por Tony (Christian Malheiros), um motoboy que se arrisca pelas ruas e sofre com a pressão de sustentar a família que foi perdendo a renda por conta da pandemia; e o estresse pós-traumático da enfermeira Lídia (Miwa Yanagizawa), que precisa atuar na linha de frente no tratamento de casos de coronavírus mesmo quando está pronta para se aposentar. Ou seja, pesquisa, reflexão e sutileza são essenciais na hora de tratar de temáticas complicadas, seja em sequências de terapia ou na narrativa em geral. A experiência de escrita em "Sessão de Terapia" Escrever uma série que baseia-se muito em diálogos e personagens potentes é um grande desafio. Como foi a construção dessa parte da história na série de Jaqueline Vargas? Para ela, os "diálogos parecem ser a parte mais tranquila do processo". Afinal, "Se o personagem é bem construído, é sólido, se o arco foi bem traçado, se passou pelo consultor (nosso consultor é o psicanalista Ricardo Goldenberg), colocar a fala é o resultado de todo um processo", afirma. "Também procuro selecionar colegas que, pelo menos em algum ponto, tenham a ver com o paciente", adiciona a autora. "E aí eu digo que a mágica acontece, porque o roteirista coloca uma fala para o paciente que eu rebato como terapeuta e é muito bonito ver que aparecem atos falhos, surge uma escolha de palavras que inconscientemente tem a ver com o paciente". "O grande barato de 'Sessão' em termos de construção de perfil psicológico de personagem é estar sempre aberto para o fato de que o personagem não tem apenas fala e subtexto, ele tem inconsciente". - Jaqueline Vargas Para além da experiência de lidar com o inconsciente narrativo, “Sessão de Terapia” ainda traz a experiência da adaptação, já que a série original é israelense e de 2005. Como foi esse processo de adaptação para um cenário brasileiro? Vargas conta que "a da primeira temporada foi muito tranquila porque o original é maravilhoso. E se não se pode fazer melhor, o ideal (em adaptação) é não mexer no que está bom". Já que são países diferentes, a roteirista comenta que algumas personagens representavam situações inexistentes no Brasil, requerendo certa mudança. "A segunda temporada já foi feita com muitas modificações porque existia o desejo de seguir com a série e em Israel ela terminou na segunda temporada", comenta Vargas. "A principal preocupação era a adaptação cultural, apesar de falarmos de temas universais era preciso que o público identificasse os personagens como brasileiros". E, mesclando dificuldades universais com aspectos do contexto local, "Sessão de Terapia" obtém êxito nisso. "Gosto muito da série porque ela desmistifica um pouco do que é uma terapia e pode ser um exemplo de que todos nós temos questões, podemos nos aprimorar e ter uma vida mais apaziguada e plena. A saúde mental é saúde e deve ser mais apoiada, precisamos de mais ofertas de Caps e de atendimento para o grande público. Acho que a série fortalece essa ideia." - Jaqueline Vargas E como é a sala de roteiro de “Sessão de Terapia”? Jaqueline Vargas afirma que é bem diferente de outras experiências que já teve. "Vejo muitas salas que tratam o processo de forma burocrática, exaustiva e muitas vezes desconsiderando o lado artístico do roteirista", afirma. "Ser a head me possibilita compartilhar a minha concepção de trabalho criativo. Não vejo necessidade de horas infinitas ou de seguir modelos pré existentes de construção de temporada", conta. Isso é importante, pois a roteirista pontua que a série trabalha com pausas e contemplação, revelando que isso também entra no próprio processo de escrita. Além disso, Vargas fala muito sobre a troca e colaboração existente entre ela, o diretor Selton Mello e o produtor Roberto d’Avila. Isso ocorre "desde o primeiro momento quando eu apresento o leque de pacientes, até a consideração de elenco e leituras, polimento", conta. "Selton é muito sensível, 'Sessão de Terapia' não seria o que é sem a direção dele e a produção do Roberto d’Avila. Como eles bem dizem, é um trio que se entende muito bem". Assista "Sessão de Terapia" na Globoplay e, se precisar de mais dicas sobre construção de personagens complexas, leia nossas matérias relacionadas. Quem sabe, experimente deitar no divã! #roteiro #entrevista #SessãoDeTerapia #processo #saladeroteiro #Globoplay

  • Escrevendo para o público jovem com Ray Tavares

    Autora dedicada ao público infantojuvenil, Ray Tavares conta como foi sua transição para o audiovisual e dá dicas para quem quer escrever para a nova geração Com mais tempo a sua disposição e facilidade em criar forte relação com aquilo que consome, o público jovem está na mira dos canais e plataformas de streaming há muito tempo. É justamente essa a fatia da população que mais espera por conteúdos novos, mas muitas vezes não encontra tudo o que procura no cenário nacional. Roteirista, você desenvolve ou já pensou em desenvolver projetos infantojuvenis? Você conhece o verdadeiro potencial de mercado do conteúdo para o público jovem? Para entender esses e tantos outros pontos, conversamos com a escritora e roteirista Ray Tavares, autora de seis livros infantojuvenis, que somam mais de 50 mil exemplares vendidos. Nos últimos anos, Tavares também passou a se dedicar ao audiovisual e agora integra salas de roteiro junto com grandes nomes da indústria. Um lembrete: esse é um conteúdo construído em colaboração com o pessoal da Revista Perpétua. Lá no site deles vocês conferem a primeira parte da entrevista com foco na carreira literária da autora Ray Tavares. Se interessou pelo assunto e quer conferir o conteúdo completo? Acesse através deste link: https://www.revistaperpetua.com/post/ray-tavares-das-fanfics-para-as-telas-de-cinema Quem é Ray Tavares? Autora e roteirista, Ray Tavares possui três livros publicados pela Galera Record, “Os 12 Signos de Valentina”, com os direitos vendidos para a Boutique Filmes, “Confidências de Uma Ex-Popular”, com os direitos vendidos para a Paris Entretenimento e “Heroínas”, além de "Carta aos Astros", publicado pela MapaLab por financiamento coletivo e "Hacker" e "O Natal dos Neves" pela Amazon, somando mais de 50 mil exemplares vendidos. No Wattpad, plataforma de histórias online, atingiu a marca de mais de 4 milhões de leituras em todas as suas obras e foi vencedora do prêmio Wattys de Voto Popular em 2017. Desenvolveu ainda “Judas”, um audiodrama de thriller, formato inédito no Brasil, e “OTP - Um Par Perfeito”, audiobook de romance, ambos lançados pela Storytel. Atualmente, escreve o próximo livro para a Galera Record, "As Vantagens de Ser Você", previsto para o segundo semestre de 2021. No audiovisual, seu projeto “Robin” foi vencedor do Melhor Pitching e Segundo Melhor Roteiro de Piloto no FRAPA 2019. Atuou como roteirista na terceira e quarta temporadas da sitcom infantil “Bugados” (Scriptonita/Gloob) e, junto com Bia Crespo, escreveu o longa “Aô Sofrência” em parceria com a Sentimental Filmes. Atualmente, é criadora e chefe de roteiro de uma série ficcional em parceria com a Conspiração Filmes, para canal ainda não anunciado. Além disso, também participa do desenvolvimento e sala de roteiro de outros projetos ainda não anunciados, com as produtoras Boutique, Sentimental Filmes, TDC Conteúdo e Scriptonita. Da literatura ao audiovisual “Eu escrevo desde os 13 anos, mas para o roteiro eu migrei em 2019”, comenta Tavares, que deu seus primeiros passos na literatura escrevendo fanfics da banda Mcfly. Segundo a autora, trabalhar com fanfic “trouxe um senso de comunidade”. Entre suas influências literárias citadas do cenário brasileiro está Babi Dewet e Meg Cabot, escritoras de sucesso no cenário nacional que também devotam sua carreira ao público infantojuvenil. “E foi assim que eu comecei. Não foi planejado, foi muito natural. Eu era uma adolescente tímida, com nenhuma aptidão para esporte, nenhuma aptidão social, como a maioria dos roteiristas”, brinca Tavares, que alguns anos depois viria a publicar o seu primeiro romance “Os 12 Signos de Valentina”, que chegou a atingir a incrível marca de 2 milhões de leituras no Wattpad. “Em 2017 eu recebi o convite para publicar pela Galera Record depois de muitos ‘nãos’, muitos e-mails, muitas recusas. A gente acha que o audiovisual é difícil, mas o mercado literário é muito complexo. Série, novela e filme todo mundo assiste… Agora ler é um nicho ainda, não é um grande mercado no Brasil”. - Ray Tavares Publicar um livro não significa que a vida de uma escritora muda, assim, do dia para a noite. Ray Tavares relembra sua realidade na época - formada em Gestão Pública pela USP, Tavares dividia seu tempo entre o trabalho em uma empresa de consultoria e auditoria e sua verdadeira vocação, a escrita. Foi só quando assinou o contrato para o seu terceiro livro que Tavares decidiu pedir demissão para poder se dedicar integralmente à escrita. "Nesse ponto eu tinha entendido que não daria para viver de livros, infelizmente são poucas as pessoas que vivem exclusivamente de direitos autorais no Brasil hoje”, comenta Tavares, que continua: “aí eu comecei a pesquisar as minhas possibilidades dentro disso. Nessa época a produtora Pródigo se aproximou de mim para tentar adaptar ‘Os 12 Signos de Valentina’. Foi aí que eu conheci melhor esse meio audiovisual”. Na época, a adaptação do seu livro acabou não indo para frente, mas Tavares teve seus primeiros contatos com o meio audiovisual e decidiu investir na sua formação como roteirista através de cursos especializados. Formação, networking e trabalho duro “A literatura acaba sendo meio que um cartão de visitas para quem está migrando. A literatura serve para mostrar seu estilo, como você conta uma história. Acaba sendo um ponto positivo para o roteirista que não tem nada filmado ainda”, comenta Tavares sobre o lado positivo de entrar na área audiovisual já tendo publicado alguns livros. Afinal, além de apresentar bem o seu estilo, se você conquistou algum público com a literatura, muito provavelmente esse público se tornará uma prova de que o seu trabalho atende a um nicho. Ou seja, uma “materialização” do seu potencial comercial. Como nem tudo são rosas (na verdade são poucas as “rosas no caminho”), Tavares também reflete sobre pontos negativos nesse processo de migração: “Eu sinto também que um ponto negativo é que às vezes as pessoas têm um pé atrás - ‘olha lá a autora de livros que acha que sabe o que tá fazendo’. Aconteceu comigo, não sei se acontece com outras pessoas. Mas eu sempre deixei claro que estava estudando, aprendendo, pedindo uma chance para mostrar o que eu sei fazer. Alguns produtores e roteiristas acabam te marcando como ‘a garota do livro’, então tem um pouco disso também. É uma barreira.” - Ray Tavares “Eu sinto hoje que muita gente fala que vai migrar da literatura para o roteiro, escreve um projeto e pronto, diz que é roteirista. Como que eu chego em uma profissão nova e digo que imediatamente sou também?”, reflete Tavares, que estudou o ofício na Roteiraria por dois anos antes de se apresentar como “roteirista”. Cursos especializados são ótimos ambientes para fazer networking, uma vez que além do objetivo em comum, normalmente os participantes têm acesso a materiais e projetos em desenvolvimento pelos colegas. “Na Roteiraria eu fui conhecendo mais pessoas do meio. Conheci a Bia [Crespo] logo em seguida e consegui vender um projeto para a Paris Entretenimento, onde ela trabalhava na época”, responde Tavares. A autora brinca que 2019 foi “o ano do ‘sim’”, mas 2020 seria “o ano do ‘sim’ remunerado. Entre um estágio e outro, Tavares participou de muitas rodadas de negócios, desenvolveu projetos de graça e se apresentou a diversas produtoras. “No final de 2019 eu e a Bia [Crespo] escrevemos o projeto ‘Robin’, baseado em um conto meu, e fomos para o FRAPA. Aprendi muito nesse processo com ela. E aí veio a minha primeira grande surpresa no audiovisual - a gente ganhou o Prêmio de Melhor Pitching e ficou em segundo lugar no Prêmio de Melhor Piloto. Foi a primeira coisa que escrevi na minha vida de roteiro e já ganhei alguma coisa, então eu pensei - ‘legal, depois desse tempo todo eu tive algum retorno, então acho que vou continuar investindo’” - Ray Tavares Nesse meio tempo, Tavares adquiriu confiança como roteirista, vendeu os direitos do seu livro “Confidência de uma Ex-Popular” para a Paris Entretenimento e decidiu seguir investindo na sua formação. Esse trabalho de campo vinculado ao estudo constante garantiu a ela uma vaga na sala de roteiro da série infantojuvenil “Bugados” (Scriptonita/Gloob), criada por Luca Paiva Mello e André Catarinacho. “Passei 2020 inteiro fazendo a terceira e quarta temporada de ‘Bugados’ e desenvolvendo outros projetos”, comenta. Ray Tavares não continuou em “Bugados”, pois agora integra uma sala de roteiro junto com a roteirista Bia Crespo em um projeto onde assina como criadora e headwriter (roteirista-chefe). “É a oportunidade da minha vida! Fiquei muito, muito grata”, responde Tavares, deixando claro que as informações sobre o novo projeto ainda são confidenciais. Escrevendo para o público jovem Embora hoje atue no mercado também como roteirista, Ray Tavares não abandonará a literatura. A autora afirma que continua escrevendo o seu próximo livro, mas com o ritmo menos acelerado: “meu ganha pão agora é trabalhar com roteiro”. Além do talento com as palavras, um diferencial que ajudou Ray Tavares nessa transição foi o seu foco como autora: o público infantojuvenil. Principalmente agora, com a chegada do alto investimento das plataformas de streaming no Brasil, notamos a demanda por conteúdo infantojuvenil crescer, mas são poucos os roteiristas que hoje se dedicam ao gênero. A própria Tavares comenta que da sua turma da Roteiraria, ela era a única que estava ativamente desenvolvendo um projeto infantojuvenil. Escrever para o público jovem pode ser um grande desafio, ainda mais quando os autores já não fazem mais parte dessa “nova geração”. Para Tavares, o fator do tempo também é outro desafio: “em menos de 5 anos muda tudo!” “Como eu escrevo para adolescente, meu estilo é reconhecer que o adolescente é completamente capaz de consumir uma série sobre qualquer assunto que a gente levar para ele. Eu acho que estamos tratando adolescentes como idiotas, um pouco. Um adolescente é um pré-adulto, ele tá quase entrando na vida adulta, ele sabe do que ele tá consumindo. A gente tem produções como ‘Euphoria’, ‘Sex Education’, ‘Eu Nunca…’, produtos gringo que estão tratando o adolescente como um ser pensante, que está desenvolvendo a própria consciência no mundo”. - Ray Tavares Quando falamos em “conteúdo para público jovem”, talvez alguns roteiristas pensem mais em “limitações” do que “liberdades”. Para Tavares, é justamente a liberdade criativa que a cativa nessa sua especialidade. “Para você escrever para o público jovem é preciso afundar na emoção. Um mês para um adolescente é um ano. A gente cresce e adquire vergonhas sociais e às vezes esquece como era”, responde Tavares. “O adolescente consome muito! A criança depende exclusivamente dos pais e o adulto perde um pouco essa obsessão pelas coisas. O adolescente tá naquele meio do caminho - talvez ele já tenha uma graninha para gastar e é um público que consome muito e por muito tempo”. - Ray Tavares A verdade é que o adolescente corresponde a uma grande fatia do mercado, principalmente para os streamings, onde os conteúdos infantojuvenis são, muitas vezes, “portas de entrada para novos assinantes”. Além do potencial comercial do infantojuvenil, vale destacar que o mercado audiovisual, no momento, busca principalmente narrativas leves para contrapor ao cenário caótico que testemunhamos ao redor do mundo. Mais do que nunca nós precisamos sonhar, nos encantar por personagens fascinantes e dar boas risadas. Desafios de escrever para o público jovem Ray Tavares salienta o papel da pesquisa quando se espera desenvolver projetos para o público jovem, desde que seja uma pesquisa orgânica. A autora afirma ter uma conexão natural a temáticas infantojuvenis e utiliza muito o twitter como forma de estar atenta às tendências. “O grande desafio de escrever para jovens, primeiro, é chamar a atenção dele. É muito conteúdo nacional e internacional, que vem de ‘n’ plataformas diferentes. Como é que você compete com o Tik Tok? As pessoas estão contando histórias cada vez mais elaboradas no TikTok”, provoca Tavares, mostrando que são inúmeras as plataformas que o jovem consome e como é difícil se destacar nesse meio. “Querendo ou não, eu não sou mais adolescente. Um grande desafio é ficar realmente inteirada com o que o adolescente quer consumir. Hoje é uma coisa, ano que vem é outra. Tem que acompanhar esse ritmo intenso de mudanças”. - Ray Tavares “Intenso” é uma boa palavra para entender o que significa dedicar-se a esse público. Você tem a chance de sonhar alto, pesar a mão nas emoções e apresentar o lado “mágico” do cotidiano. Para completar, temos um mercado que precisa desesperadamente de conteúdos para toda essa nova geração de adolescentes, que muitas vezes buscam séries e filmes de fora. Você quer escrever para o público jovem? Tem um projeto infantojuvenil? É um bom momento para você, roteirista! #roteiro #audiovisual #infantojuvenil #cinema #TV

  • O‌ ‌que‌ ‌o‌ ‌mercado‌ ‌busca,‌ ‌com‌ ‌TDC‌ ‌Conteúdo‌

    Bia Crespo, sócia-fundadora da TDC Conteúdo, fala sobre as tendências do mercado audiovisual e dá dicas para você pensar em projetos comerciais Você escreve projetos para o mercado? Parece ser uma pergunta ampla e até mesmo um tanto abstrata para muitos roteiristas, mas é muito importante tê-la em mente na hora de investir o seu tempo em uma nova empreitada criativa. Todo roteirista tem sua identidade, seu perfil e sonhos específicos para a sua carreira. Independente disso, todo roteirista também precisa pagar suas contas. O que isso significa? Significa que em algum momento ele precisa ter um retorno financeiro. Nem tudo é sonho nessa vida! Quando falamos em retorno, tratamos necessariamente de lógica de mercado. Quais são as tendências do mercado audiovisual brasileiro? Como aumentar suas chances de emplacar um projeto? Existem demandas que o mercado não consegue suprir? Para responder essas e tantas outras perguntas que nos fazemos diariamente, convidamos novamente a roteirista Bia Crespo para um papo sobre o mercado audiovisual. Já temos uma entrevista com a Bia Crespo aqui no site, caso você ainda não tenha lido. Dessa vez, a roteirista apresenta a TDC Conteúdo, uma produtora de desenvolvimento criada por ela e que já vem comercializando projetos com grandes players do mercado. A TDC Conteúdo A TDC Conteúdo é uma produtora de desenvolvimento que tem como foco principal ajudar novos roteiristas a entrar no mercado. Seus projetos são comerciais, majoritariamente de comédia, voltados ao público familiar ou infantojuvenil. O trabalho da TDC é criar uma ponte entre roteiristas e produtoras ou players depois de ter desenvolvido o projeto até o momento em que ele está maduro para ser comercializado, além de dar um apoio aos roteiristas durante essa negociação. Entre as produtoras parceiras da TDC estão Paris Entretenimento, Boutique Filmes, Glaz, Chatrone e Elo Company. Para mais informações, acesse www.tdcconteudo.com.br. Bia Crespo Formada em Audiovisual pela ECA-USP, se especializou em roteiro para cinema e TV na Vancouver Film School. Foi Coordenadora de Conteúdo da Paris Entretenimento por dois anos e, em 2019, roteirizou os longas "10 Horas Para o Natal" (Paris Filmes), "A Sogra Perfeita" (Paris Filmes) e "Galeria Futuro" (H2O). Com seus projetos originais, foi finalista do concurso de roteiros do FRAPA e venceu o Prêmio Cabíria, tornando-se em seguida roteirista fixa da Conspiração Filmes. Em 2021, integrou a sala de roteiro de uma série inédita da Globoplay e escreveu dois longas-metragens originais para a Paris Filmes. Atualmente, é chefe da sala de roteiro de uma série original sua em desenvolvimento na Conspiração Filmes. É sócia-fundadora da TDC Conteúdo, onde coordena desenvolvimento e comercialização de projetos de novos roteiristas, e integra a diretoria da ABRA — Associação Brasileira de Autores Roteiristas. Como funciona a TDC Conteúdo? Completando 1 ano de existência, a TDC Conteúdo ainda está se estruturando e trabalha com um modelo relativamente novo no Brasil, afirma Crespo. “Por enquanto eu diria que a TDC é a combinação de um núcleo de desenvolvimento, uma produtora de conteúdo e um agenciamento”, completa a roteirista. Isso significa que a TDC trabalha como um fator intermediário entre o roteirista e os players, assumindo um papel importantíssimo para abrir espaço a novos autores, muitos deles ainda batalhando para conquistar vias de acesso e contatos com agentes do mercado. Como funciona a TDC, afinal? Bia Crespo revela que normalmente busca projetos para a produtora de desenvolvimento através de rodadas de negócio, ou mesmo indo atrás de roteiristas que já fazem parte da sua rede de contatos. Crespo destaca seu desejo de conhecer novos roteiristas e sair um pouco da sua própria bolha. “Eu procuro projetos que eu acho que tenham algum potencial comercial”, revela Crespo, deixando claro que a TDC opta por trabalhar de acordo com as tendências e demandas do mercado. Ou seja, projetos para grande público. Uma vez selecionado, o projeto então passa por um processo de desenvolvimento acompanhado pela própria roteirista. “Eu ajudo na sinopse, arco de temporada, descrições de personagens. Isso é mais para a pessoa entender realmente o que é o projeto dela”, comenta Crespo. “Às vezes o roteirista vai muito longe no desenvolvimento e se perde um pouco no que está acontecendo ali. É interessante voltar para um estágio onde a gente se pergunta como seria se fosse apenas um pitch”. - Bia Crespo Além do valor criativo, esse processo também serve para que Crespo desenvolva um documento de venda ainda menor - mais ou menos um parágrafo - para integrar o catálogo de projetos da TDC. Esse catálogo, então, é levado a produtoras para avaliação. Passando credibilidade para os players Bia Crespo conta que os players também procuram a TDC atrás de projetos específicos, já sabendo do seu histórico no mercado. “Por eu ter circulado muito entre as produtoras, acontece muito de me pedirem projetos. Como nem sempre tenho agenda, comecei a agenciar as pessoas”, revela a roteirista. Se você não tem experiência no mercado, como convencer um player a investir no seu trabalho? Como fazê-lo confiar na sua habilidade de entregar uma demanda importante? É aí que entra um intermediário como a TDC, que já vem com o currículo da Bia Crespo como garantia real de que existirá um acompanhamento que eleva a qualidade e entrega. “Quando uma produtora se interessa por um projeto, eu negocio todos os valores de desenvolvimento considerando o interesse do roteirista e já negocio dentro a minha participação. Eu entro como consultora e acompanho todo o desenvolvimento. Eu acompanho cronograma, dou feedback nas versões e isso deixa a produtora muito mais segura. E tem apresentado melhores resultados também”. - Bia Crespo Se existe a TDC fazendo esse papel de núcleo e agenciamento, existe uma alta demanda por conteúdos que não chegam aos produtores e players. Que conteúdos são esses? Que demandas não são atendidas no volume que os players gostariam? Como roteiristas, estamos apostando nas ideias certas? Demandas do mercado “Pelo que eu vejo nas rodadas de negócio, eu tenho a impressão de que cada vez mais as pessoas estão indo para o lado errado, tanto nas sinopses, quanto nos formatos”, comenta Crespo, que vem participando de eventos assim como player. Para Crespo, um dos principais sinais de que os roteiristas iniciantes vêm investindo em apostas difíceis de vender é a quantidade de projetos de séries que vêm pipocando no mercado. Segundo a roteirista, é bem complicado vender um projeto de série, ainda mais vindo de um profissional em início de carreira. Crespo sugere que o roteirista observe os créditos de criação das séries brasileiras exibidas em canais e plataformas de streaming. Segundo a roteirista, “é só gente muito experiente do mercado”. Com exceção, é claro, da série “3%”, que foi justamente uma rara aposta de trazer um frescor ao catálogo de conteúdos da Netflix. Mesmo assim, foram anos de desenvolvimento e investimento para que “3%” integrasse o catálogo da plataforma. “Não tô dizendo que não dá. Dá sim! Eu mesma tô desenvolvendo a minha primeira série, que consegui vender depois de dois anos circulando pelo mercado, de trabalhar com várias produtoras, fazer mais de cinco filmes, trabalhar em salas de roteiro e ser conhecida no meio”, destaca Crespo. Tá começando? Aposte no longa-metragem! Se é mais difícil vender projetos de séries, uma boa dica para quem está iniciando no mercado é ter alguns projetos de longa-metragem para oferecer em rodadas. Bia Crespo dá a dica de ouro: “todos os streamings estão fazendo filme. Para eles é muito mais barato, mais fácil, uma aposta mais certa. Se der errado, não tem tanto prejuízo. Se você está iniciando, aposte em um filme!” Isso não significa que você deve esquecer seus projetos de série. Bia Crespo deixa claro que é bom desenvolver séries, principalmente para seguir praticando a escrita no formato. Para comercializar, porém, é importante ter pelo menos dois ou três projetos de longa-metragem na manga. Crespo revela que não é tão fácil assim encontrar premissas de filmes com apelo comercial, mas é exatamente isso que ela procura em rodadas e contatos diretos. Quando encontra, muitas vezes o obstáculo é estrutural: Crespo comenta que a maioria dos projetos de filme que chegam à TDC buscam ousar demais. “Uma boa dica é não ousar tanto na estrutura do seu filme se você pretende vendê-lo para um grande player. Siga parâmetros industriais comuns, estrutura de três atos. Parece óbvio falar isso, mas quase não encontramos projetos de longa ‘tradicionais’, clássicos. Você vê muito filme querendo revolucionar, sair do óbvio, inventar o que nunca foi feito, mas você quase nunca vê aquele filme que segue mais a receitinha. E essas são as receitas que vendem”. - Bia Crespo Arte x mercado: a busca pelo equilíbrio Com o triste congelamento das políticas públicas voltadas ao audiovisual brasileiro, passamos da “história que eu quero contar”, para “o projeto que os players querem produzir”. O ideal é encontrar um equilíbrio entre a arte e o ofício, uma intersecção entre a visão de mundo e a demanda de mercado. “Dá para encontrar arte dentro do ofício também, dá para fazer projetos comerciais com a sua personalidade e contando coisas que você gostaria de ver”, responde Crespo. Talvez uma herança desse período onde havia grande investimento no fomento de novas vozes autorais, a vontade de subverter gêneros e quebrar preceitos estruturais segue firme e forte. Sobre isso, Bia Crespo nos lembra: "mais do que nunca, as pessoas querem um conforto dos filmes, das séries, sem se decepcionar. Nem sempre as pessoas querem ser surpreendidas". “Pensa bem: você construiu o seu filme inteiro para chegar no final e subverter tudo? Você está subvertendo só por subverter? Não tente subverter só no final, então. Busque criar uma estrutura diferente para o final casar com ela”. - Bia Crespo Crespo afirma isso com conhecimento de causa, uma vez que dedica muito da sua carreira a adaptar sua visão artística a formatos e narrativas que têm mais chance de agradar os players. “Eu já devo estar no meu sétimo ou oitavo projeto de longa-metragem vendido. Isso porque eu faço esse formato e eu quase não tenho concorrência. Eu falo isso porque eu gostaria de ter! Eu quero ter mais gente comigo”, revela. Um bom exercício de base é observar as maiores bilheterias do cinema nacional. Considerando isso, Crespo aponta que a comédia é sempre um bom caminho. A roteirista também destaca que comédias românticas, filmes infantojuvenis e para toda a família são, sem sombra de dúvidas, os mais procurados pelo mercado. “Eu conheço bastante gente que diz que queria tanto uma chance. Muita gente vem me perguntar o que é preciso para entrar no mercado, como se existisse um grande segredo. Não existe segredo, existe você entender o que o mercado está procurando”. - Bia Crespo Isso significa também entender como funciona o mercado hoje, uma vez que passamos por uma grande transição no modelo de investimento. “O fim das políticas públicas é algo que sou absolutamente contra, pois elas dão espaço para novas vozes e narrativas. Agora, infelizmente perdemos algumas vozes autorais, principalmente as menores produtoras, mas ganhamos em volume de produção. Tem muita coisa sendo feita”, completa Crespo, deixando claro que para quem busca o caminho comercial “é um bom momento para entrar no mercado”. Escreva com o público-alvo em mente Você pensa no seu público-alvo quando escreve, ou só depois que termina? Esse é um ponto importante para qualquer roteirista. “Eu sempre olho questões como idade e classe social a partir da protagonista. Geralmente as pessoas se pautam por isso”, comenta Crespo. Se você desenvolver um protagonista de quarenta e poucos anos que mora na periferia, muito provavelmente você está mirando justamente esse público (e é bom ter isso em mente na hora de desenvolver seu projeto). Para o público infantil e infantojuvenil essa lógica é um pouco diferente. Bia Crespo revela que crianças e adolescentes tendem a ver uma faixa etária acima da delas, com algumas exceções dependendo da temática. “'High School Musical', por exemplo, vai mirar um público mais novo por ser uma comédia musical que trata temas muito leves. Temas como primeiro beijo, amizade, tretas de escola. As personagens de 'Euforia', da HBO, têm a mesma faixa etária, mas eles tratam de temas completamente diferentes. Já é drogas, questões psicológicas, sexo, abuso. Os temas elevam a faixa etária também”. - Bia Crespo É preciso também pensar no canal para materializarmos um pouco melhor essa questão, mesmo que ainda seja o caso do “canal ideal para o seu projeto”. Seu projeto pode ser um infantojuvenil, mas onde ele passaria? Em um streaming, no Disney Channel, ou em um canal aberto? Os pais e os filhos veriam juntos confortavelmente? Pense nisso! Pensando fora da bolha Bia Crespo acredita que um grande desafio para os roteiristas é justamente pensar fora da bolha. Como em qualquer outra profissão, quem trabalha com audiovisual passa a fazer parte de uma certa “bolha”. Passamos a nos conectar com outros profissionais do meio, frequentar grupos de discussão, trocar referências, tendências, enfim… É fácil se “descolar” do que o grande público (fora dessa pequena bolha) realmente consome. Crespo sugere que o roteirista pense nos seus amigos de escola, “que muitas vezes são um bom termômetro”. É mais fácil que seus amigos de escola tenham trilhado outros rumos na vida e não passem tanto tempo assim pesquisando tendências e refletindo sobre o processo criativo. Dito isso, é interessante também analisar algumas narrativas que vão bem com o grande público, mas talvez não façam mais tanto sentido no cenário atual. “Cuidado com isso de fazer séries de grupo de amigos vivendo o dia a dia. Já foi feito. 'Friends' já fez. Não precisa inventar a roda, mas também vamos tentar sair do que já foi feito demais. Precisa ter algum diferencial”. - Bia Crespo Um espaço para projetos comerciais Não podemos falar da carreira de roteiristas iniciantes sem tratar de laboratórios e concursos de roteiro. Muitas vezes são eventos assim que conferem ao profissional sua primeira base de contatos, bem como certo prestígio, que serve como comprovação de que aquele roteirista realmente é capaz de entregar um produto de qualidade. Bia Crespo afirma entender bem o papel de eventos assim, buscando “cultivar novas vozes e apostar em histórias relevantes e contemporâneas". Por outro lado, a roteirista também nota que para aqueles autores que desenvolvem projetos com perfil comercial existe ainda uma certa ausência de oportunidades. “Por mais que a ideia seja criar uma coisa que vai dar dinheiro, esses roteiristas passam pelas mesmas dificuldades. Quem vai confiar neles para um primeiro trabalho se eles não conhecem ninguém? Às vezes falta experiência, um jogo de cintura para fazer uma negociação, um caminho para trilhar”. - Bia Crespo Sem o ingresso em eventos de mercado e sem esses primeiros “selos de aprovação”, o que fazer se você tem um projeto com foco comercial e pouca experiência no ofício? “A TDC veio disso também, da vontade de reunir esses roteiristas com perfil comercial e tentar ajudá-los a encontrar um caminho através dessa mentoria”, responde Crespo. É justamente isso que buscamos também com o LAB 51, uma parceria entre a Writer’s Room 51 e TDC Conteúdo. Queremos preencher essa lacuna do mercado audiovisual, proporcionando conteúdo teórico e prático para roteiristas que tenham projetos com perfil comercial. Além disso, também buscamos criar pontes entre roteiristas iniciantes e agentes do mercado, entendendo que esse também é um grande obstáculo para quem está chegando agora. O LAB 51 selecionará 6 projetos de longa-metragem para participar do processo de desenvolvimento guiado por Bia Crespo, responsável pelas aulas, consultoria individual com os roteiristas e definições sobre o futuro de cada projeto. No fim do processo, os 6 participantes também farão um pitch para uma banca de profissionais do mercado audiovisual a serem apresentados futuramente. Tem um projeto de longa-metragem e quer participar do LAB 51? Acesse o regulamento e inscrição através do link: https://www.writersroom51.com/regulamento-lab51 Quando for desenvolver sua sinopse para o LAB 51, lembre-se das importantes dicas e reflexões de Bia Crespo aqui nessa matéria! #roteiro #roteirista #cinema #projetoscomerciais #LAB51

  • Escrevendo em Hollywood com Paula Sabbaga

    A roteirista de “Dynasty” divide sua trajetória no audiovisual e dá dicas para quem quer construir sua carreira no exterior Você já pensou em trabalhar nos EUA? Muitos roteiristas cresceram e se apaixonaram pela profissão através de séries e filmes hollywoodianos. Enquanto para muitos Hollywood é uma realidade distante, outros profissionais conseguiram furar essa bolha e hoje escrevem sucessos que a gente vê na TV e em plataformas de streaming. Esse é o caso de Paula Sabbaga, roteirista formada pela FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado) e que hoje mora em Los Angeles, onde trabalha em salas de roteiro de séries televisivas. Sabbaga dividiu com a gente um pouco da sua experiência, o processo de transição do Brasil para os EUA e o seu passo a passo para conquistar uma vaga no ViacomCBS Writers Mentoring Program. Tem interesse em escrever para séries norte-americanas? Então veja o resultado desse super bate-papo a seguir! Quem é Paula Sabbaga? Roteirista há 10 anos, com formação em Cinema pela FAAP e mestrado em Roteiro de Cinema e TV na University of Southern California, Paula Sabbaga já assinou projetos de grande porte tanto no Brasil como nos Estados Unidos. Antes de se mudar para os EUA, participou de roteiros de diversos programas como “Plantão do Tas” (Cartoon Network), “Conversa de Gente Grande” (Band), “Os Fatos Espetaculares de 2012” (Band), “Desimpedidos na Copa das Confederações” (Canal Desimpedidos), “O Que Tem Pra Hoje” (Comedy Central Brasil), “Caos” (History Channel) entre outros. Nos Estados Unidos, desenvolveu projetos em parceria com diversos estúdios e produtoras como CBS, Disney+, 21 Laps, Whitaker Entertainment, IDW Comics e Vast-Entertainment, além de ter participado por três temporadas da equipe de roteiristas da série “Dynasty” (The CW/Netflix). É ganhadora do prêmio Humanitas: New Voices e atualmente trabalha como roteirista e co-produtora da série "Walker" (The CW). O início da carreira nos EUA Já com bastante experiência em TV, Paula Sabbaga teve sempre claro seu objetivo de trabalhar com ficção. Segundo a roteirista, seu desejo de estudar fora se dava principalmente para “aprender a escrever as séries que assistia”. Assim, Sabbaga pausa sua carreira no Brasil para ingressar no mestrado na University of Southern California, em Los Angeles. “Foi a melhor decisão que eu tomei na época”, comenta Sabbaga. Além de dedicar-se aos estudos, Sabbaga conta que estagiou bastante na época, o que a levou a trabalhar em uma agência de talentos. “Na época eu ainda me sentia muito mais uma boa aluna do que uma roteirista completa”, revela Sabbaga, deixando claro que sabia bem onde podia melhorar em seu desenvolvimento como roteirista. Por causa de sua experiência na agência, Sabbaga conseguiu um agente e trabalhou como assistente em algumas séries televisivas. “Trabalhei para showrunners como assistente deles. Trabalhei em uma série chamada ‘Guilt’ e depois fui trabalhar em uma série chamada ‘The 100’ como assistente do Jason Rothenberg, o criador da série”, destaca a roteirista. Enquanto no Brasil Paula Sabbaga se dedicou bastante à não-ficção, a roteirista encontrou novas oportunidades e desafios nos EUA. Conquistou espaço em salas de roteiro, onde conseguiu evoluir sua escrita de ficção, mas também descobriu uma nova dinâmica de trabalho enquanto subia hierarquicamente no quadro de roteiristas. Na série “The 100”, Sabbaga teve a experiência de trabalhar como assistente de roteiro e conta um pouco das suas obrigações na época: “Seu trabalho é sentar e anotar tudo o que os roteiristas estão comentando, então depois mandar esse relatório no fim do dia para que eles sempre lembrem das decisões e como eles chegaram lá”. - Paula Sabbaga Para Sabbaga, trata-se de um trabalho essencial para a formação de um roteirista, uma vez que você acompanha todas as etapas do desenvolvimento de um roteiro - das primeiras ideias ao produto final. Mas afinal, como a roteirista conquistou suas primeiras oportunidades de trabalho no exterior? Paula Sabbaga nos conta, em detalhes, o importante papel das bolsas de mentoria oferecidas por grandes players do mercado! Bolsas de Mentoria para roteiristas “Tive muita sorte de entrar em um programa da CBS”, revela Sabbaga, apontando um caminho muitas vezes desconhecido para a maioria dos roteiristas brasileiros. A roteirista dá mais detalhes sobre o assunto: “Vários estúdios aqui oferecem fellowships programs (programas de bolsas), que ajudam roteiristas que querem se profissionalizar. Às vezes são pessoas que estão começando, assistentes de roteiro que precisam de um empurrãozinho para se tornarem roteiristas. Esses programas ajudam a preparar o profissional para o mercado, tanto na parte criativa quanto nos negócios”. - Paula Sabbaga Tais programas fazem toda a diferença para o desenvolvimento profissional de um roteirista, já que há mentorias especializadas e um plano de crescimento dentro dos próprios canais que oferecem essas oportunidades. “Enquanto eu trabalhava no 'The 100', toda quarta eu ia nesse programa de mentoria da CBS onde eu treinava junto com showrunners”, revela Sabbaga, que completa: “Um executivo da CBS te acompanha o tempo todo e te ajuda a escrever um piloto de série seu”. Já no fim do programa, o mentor de Sabbaga perguntou à roteirista que séries, daquelas que estavam para estrear no canal, ela se identificava mais. O intuito dessa pergunta é justamente oferecer um caminho para os profissionais que já encerram o ciclo de mentoria, prontos para suas primeiras entrevistas. “Acabei indo para quatro entrevistas e fui convidada para trabalhar nas quatro séries. Isso só mostra o quanto o programa ajuda. Ele te treina a fazer esse tipo de entrevista, como se comportar, o que esperar, como se destacar, esse tipo de coisa.” - Paula Sabbaga Das quatro séries, Sabbaga se identificou mais com "Dynasty'', algo muito mais próximo de uma novela, segundo a própria roteirista. Ela afirma que toda a sua experiência cultural de ter crescido assistindo novelas a ajudou na sala de roteiro, pois a série trabalha muitas das ferramentas do melodrama. Sabbaga foi roteirista da série por três anos, mas acabou encerrando o ciclo por querer se dedicar a novos projetos, focando em desenvolver outras habilidades como roteirista. Paula Sabbaga acabou por ser convidada a integrar a equipe de roteiro da série “Walker”, uma adaptação do sucesso dos anos 1990 “Walker, Texas Ranger”, protagonizada na época pelo ator Chuck Norris. A adaptação traz o ator Jared Padalecki como protagonista. “Eu queria muito trabalhar em ‘Walker’ por ser uma série que chamamos de procedural. Eu queria aprender como escrever esse tipo de série”, Sabbaga completa. Como ingressar em um programa de mentoria nos EUA? “A parte mais legal é que todo mundo pode aplicar, você não precisa ser estudante, você não precisa ter um trabalho fixo”, começa Sabbaga, mostrando que conquistar aquela tão desejada bolsa de mentoria não está tão longe assim de você. A roteirista pontua que, para a maioria dos estúdios, a inclusão e diversidade tem certa prioridade, mesmo quando não é exatamente o foco. Segundo Sabbaga, os estúdios “querem diferentes vozes para contar novas histórias”. Além da CBS, isso inclui grandes players como Warner Bros, Disney, AMC, etc. “Pra eles eu era lésbica, latina e imigrante, então eu me enquadrava bem nisso”, Sabbaga revela, dando mais detalhes sobre o processo em si. “Você manda um roteiro original e um spec, normalmente um episódio de uma série que já existe. No geral todas as fellowships abrem mais ou menos ao mesmo tempo, então dá para aplicar para várias. Se eles gostarem, você vai para uma entrevista. Se eles acreditarem que você tem boas histórias para contar e está pronto para crescer na carreira, eles te colocam no programa”. - Paula Sabbaga Em nossa entrevista, Paula Sabbaga conta com maiores detalhes a sua experiência no programa de mentoria da CBS - o funcionamento, as vantagens, a questão do visto e os caminhos apontados uma vez que o ciclo é finalizado. Quer entender melhor todo esse processo e ficar por dentro desse e tantos outros conteúdos exclusivos? Considere apoiar o Writer's Room 51 no Catarse e faça parte do nosso grupo fechado! Além de conteúdo extra de cada entrevista, você terá acesso a materiais exclusivos sobre roteiro e concorre a uma consultoria grátis. Quero apoiar o Writer's Room 51 Liberdades criativas x lógica de mercado As experiências no Brasil e nos Estados Unidos colocam Paula Sabbaga em uma interessante posição. É possível entender diferenças no processo de desenvolvimento, mas também nas dinâmicas de trabalho. Segundo ela, “a principal diferença é a questão do ego”. A própria roteirista aponta que tem suas ressalvas a respeito dessa colocação. Com um mercado fomentado por iniciativas privadas, onde players arriscam seu próprio dinheiro em grandes apostas, naturalmente a relação que o roteirista tem com a própria obra é um pouco diferente. Sabbaga comenta: “essa coisa de ‘vou escrever algo meu e quando a gente vender, ganhamos uma grana’ é muito difícil de acontecer”. Então como é que funciona de fato? A roteirista afirma que seus projetos autorais não são criados necessariamente para serem produzidos. “Na verdade é tudo uma carta de apresentação para que um estúdio me convide para escrever o projeto deles”, completa. “Eu estou escrevendo agora um longa-metragem de ação e comédia. Então eu sei que se um estúdio estiver com um projeto de ação e comédia, eles vão saber que eu posso desenvolver o roteiro para eles. Por isso eu acabei criando um certo ‘distanciamento’ das coisas que faço. Eu foquei mais no futuro da minha carreira, o que - consequentemente (e, de vez em quando, infelizmente) se torna algo muito mais prático do que sentimental”. - Paula Sabbaga Com as linhas de incentivo do Fundo Setorial do Audiovisual, os projetos contemplados já eram integralmente financiado pelo fundo, proporcionando ao criador certa liberdade criativa. Naturalmente, essa lógica vem mudando cada vez mais. Com o triste enfraquecimento das iniciativas públicas, vemos um mercado quase que 100% voltado às iniciativas privadas, através de players. Por um lado, é muito bom ver novas plataformas de exibição injetando recursos no mercado audiovisual brasileiro. Por outro lado, estamos perdendo uma importante ferramenta de fomento a novos artistas. Sobre isso, Sabbaga comenta: “Não existia esse peso financeiro nas costas da produção. Você escrevia o que queria realmente ver e isso era sensacional”. Com isso, podemos entender que a lógica de um mercado sólido como Hollywood coloca outras responsabilidades nas mãos dos roteiristas (em muitos casos). A liberdade criativa e o apego ao desenvolvimento do seu projeto nem sempre são prioridade. Há um caminho a ser construído até lá. A boa notícia é que esse caminho realmente existe - Paula Sabbaga está aí para provar que não há fronteiras para quem quer viver da escrita. #roteiro #audiovisual #roteirista #TV #Hollywood #entrevista

  • 6 dicas práticas para escrever uma dramédia

    Aprenda a construir uma dramédia com reflexões sobre os gêneros e dicas incríveis da roteirista Phoebe Waller-Bridge O que “comédia dramática” realmente significa? Quais os principais pontos para se manter em mente quando concebemos histórias com essa abordagem? Como trazer seriedade e comicidade a uma mesma história? Em geral, são narrativas que fundem comédia e drama para nos dar uma experiência emocional mais rica do que apenas um gênero é capaz de fazer sozinho. Qualquer drama comum pode nos fazer chorar. Qualquer comédia sagaz pode fazer nosso abdômen doer de tanto rir. Mas uma comédia dramática, ou dramédia, pode fazer as duas coisas. E deve fazer as duas coisas, se quiser ser rotulada como tal. Porém, não é tão simples assim. Na verdade, é possivelmente uma das combinações mais complexas de se mesclar. Por isso, trazemos 6 dicas práticas traduzidas e adaptadas do Script Reader Pro e da roteirista, atriz e produtora Phoebe Waller-Bridge, que assina séries de sucesso como "Fleabag" (2016), "Killing Eve" (2018) e mais. Acompanhe! O que torna as dramédias tão poderosas? A força de um drama é algo que está enraizado na experiência humana. E, hoje em dia, o público está mais sofisticado e exige arcos emocionais mais convincentes. Uma pessoa não sente apenas uma emoção durante toda a vida. Estamos em um estado de fluxo constante. Mesmo em um único dia, um indivíduo pode passar por uma miríade de sentimentos e emoções. Talvez seja por essas razões, as dramédias realmente ressoam com espectadores. Isso é o que os torna altamente relacionáveis e comercializáveis - há algo para todo mundo. E altamente identificável e comercializável é uma coisa ótima quando você está escrevendo qualquer roteiro. No geral, uma comédia dramática é uma expressão dinâmica e complicada de nossos egos dinâmicos e complicados, colocada no papel e vista na tela. É justamente por essas razões que torna a criação particularmente desafiadora, mas também imensamente gratificante (e comercializável). E, agora, vamos às 6 dicas simples para escrever uma dramédia de respeito! 1. Concentre-se nas personagens e suas falhas O que movimenta (e, idealmente, origina) uma narrativa é a personagem. Ou melhor, é o conjunto de oposições entre a falha principal, o objetivo e a necessidade de cada personagem. Tudo isso orquestrado a serviço de um ou mais temas. Na dramédia, isso não é diferente. Quem são as personagens da sua história? Quais falhas, dificuldades e reviravoltas elas precisarão passar para completar seu arco? Lembre-se da frase de Angela Carter: "A comédia é uma tragédia que acontece com outras pessoas". É seu trabalho desenvolver quem são essas pessoas e como elas lidam com dramas e momentos inusitados. Isso pode trazer ideias de pequenos detalhes de caráter, manias, hábitos ou crenças possivelmente engraçadas e também trágicas que aparecerão nas suas personagens. Precisa de ajuda com isso? Comece lendo essa entrevista e depois essa! 2. Pese a narrativa a favor do drama Aqui está a dificuldade: uma dramédia tem que servir a dois mestres e tem que realizar funções de conflito. Deve ser alegre quando necessário e repleto de drama quando necessário. É por essa mistura de gêneros que as dramédias são tão frequentemente descritas como "sinceras", "alegres" ou "charmosas". Mas misturar o drama em uma história com seu parceiro de comédia é onde está o desafio. E não há uma resposta clara ou fórmula padrão da indústria para isso. Mas há uma regra básica da dramaturgia que você pode aplicar: incline o tom do roteiro em favor do drama. Isso significa que pode ser útil abordar uma comédia dramática antes de mais nada como um drama. Mas são as reações às vezes humorísticas dos personagens ao conflito que o diferenciam de um drama direto. Em outras palavras, o equilíbrio tonal deve ser dramático, com momentos de hilaridade espalhados pela narrativa. Um exemplo: na série "Big Little Lies" (2017), a trama principal gira em torno de um marido assassino e abusivo. Porém, a narrativa mistura muitos momentos levemente engraçados, como as conversas entre as protagonistas, opiniões sinceras demais ou trocas sarcásticas entre Ed e o ex-marido de sua esposa, Nathan. Usando a comédia e o drama a seu favor Roteirista de destaque dos últimos anos, Phoebe Waller-Bridge sabe muito bem misturar momentos de drama real com um humor peculiar e original. “Tento desarmar o público o máximo que posso com a comédia e, em seguida, dou aquele soco no estômago com um drama quando menos se espera.” - Phoebe Waller-Bridge Alguns dos momentos mais comoventes em Fleabag vêm logo após uma piada. Justamente quando você pensa que é tudo risos e sorrisos, Waller-Bridge quebra o momento com uma linha ou sequência dramática. Tudo remonta à crença da autora de que as pessoas são vulneráveis quando riem, o que as deixa expostas por momentos de profundidade e drama. Comédia e drama podem ser categorias de gênero, mas são verdadeiras ferramentas que roteiristas devem ter em seu arsenal. 3. Aposte no humor sutil A comédia dramática é geralmente da variedade mais sutil. Não é aquela comédia escrachada encontrada em filmes e séries como "Se Beber, Não Case", "Se Eu Fosse Você" ou "Parks & Recreation". Isso significa que aquela cena hilária envolvendo um macaco bêbado em uma festa que está atualmente em seu roteiro dramático pode ser removida sem medo. Guarde para outro roteiro com um tom cômico mais amplo. Em vez disso, certifique-se de que o humor em seu roteiro de drama é suficientemente discreto. Portanto, incline-se mais para a sagacidade verbal e o humor enraizado no realismo, e menos para grandes momentos de comédia de erros e piadas sobre arroto. É por isso que, quando um momento abertamente exagerado da comédia física aparece em um drama, ele pode parecer fora do lugar e desnecessário. Deixe sua empolgação liderar o caminho Aqui, é importante lembrar-se novamente das falhas das suas personagens, que entrarão sutilmente em conflito e darão luz a situações cômicas. Por isso, é importante você realmente gostar da história que está contando e deixar se inspirar pelas suas vontades: o que você realmente quer ver na tela? Que tipo de situação faz você rir? “A primeira cena que escrevi para a segunda temporada [de Fleabag] é a cena no banheiro onde Fleabag está lá com o nariz sangrando, vira-se para a câmera e diz: 'Esta é uma história de amor'. Os produtores adoraram e disseram: 'O que acontece a seguir?' E eu disse: 'Não faço ideia!' Fiquei entusiasmada com isso e, a partir daí, trabalhei para descobrir quem ela odiaria o suficiente para dar um soco". - Phoebe Waller Bridge Nem sempre sabemos para onde nossas histórias estão indo. Waller-Bridge argumentaria que isso é uma coisa boa. Se sua história surpreende, se tem diálogos sérios, mas também irônicos e contraditórios, provavelmente significa que algo está funcionando. Siga esse instinto e deixe suas personagens mostrarem o caminho. Se você está animado com a perspectiva de onde algo pode levar, é provável que seu público também fique. Isso funciona com os pequenos momentos engraçados, que tornam-se especiais por não serem muito frequentes e acabam atraindo ainda mais a atenção do público. 4. Aumente o drama, diminua a comédia Ao passo que você constrói a sua ideia, é interessante perceber que em qualquer obra que mistura drama e comédia, o drama aumenta proporcionalmente com o nível de tensão da história. A comédia, contudo, faz o contrário. Mas o que isso significa? Simplesmente que seu roteiro deve se tornar cada vez mais como um drama, ao mesmo tempo que se torna menos como uma comédia. Na maioria das vezes, no momento em que um drama (um filme, pelo menos) atinge seu ato final, é mais ou menos transformado em um drama puro. As piadas praticamente desaparecem. Os divertidos mal-entendidos praticamente também somem. O que nos resta é o coração do filme - o drama que traz as lágrimas ao invés do riso - e dá uma comédia dramática com um tom especial único. Aí, o tema do filme será seu aliado para completar o arco das personagens. Alguns exemplos de histórias que demonstram isso são "Sideways" (2004), "A Primeira Noite de um Homem" (1967) e a própria Fleabag. 5. Explore sua própria vida Outra chave importante para aprender a escrever um roteiro de dramédia é explorar sua própria vida. Isso não deve ser confundido com o velho ditado "escreva o que você sabe". Alguns roteiristas aderem a isso com grande esmero. Outros argumentam que "só porque nunca estive em outro planeta, não significa que não posso escrever sobre isso". E nenhum estaria errado. Mas existe outra noção melhor ainda: "escreva o que você sente". Esse modo de pensar é absolutamente essencial na dramédia, já que o dia de todo mundo é um misto de bons e maus momentos. Além disso, sentimentos de diferentes intensidades e que surgem por motivos diferentes aumentam a sensação de identificação do público, assim como trazem à tona situações inusitadas e originais. Entenda que nossa própria vida - todos os dias - tem uma estrutura dividida em atos: manhã, tarde e noite. E muita “dramédia” acontece nos espaços intermediários. Qualquer roteirista com a ambição de escrever um roteiro de dramédia precisa sentir os grandes momentos da vida e suas minúcias, entendendo que é uma “personagem” em sua própria vida, agindo e fazendo escolhas dentro de seu próprio "arco". Agora elimine todas as partes chatas, plante esses sentimentos e experiências nas personagens, construa bem essas personagens dentro de um enredo bem estruturado e você estará no caminho certo para criar uma ótima comédia dramática. Escolha ser vulnerável “Às vezes você sente que é mais corajoso dizer algo ultrajante, mas nem sempre é. Às vezes é mais corajoso dizer a coisa vulnerável. ” - Phoebe Waller-Bridge Cada episódio de Fleabag apresenta pelo menos uma linha que é hilária, dolorosa ou de tirar o fôlego em sua honestidade. Exemplos? “Amor não é algo que pessoas fracas fazem”; “As pessoas são tudo o que temos”; “Às vezes me preocupo se eu seria menos feminista se tivesse seios maiores”, entre outras frases marcantes. Fleabag é notável em sua vulnerabilidade. E é porque Waller-Bridge entende que, às vezes, dizer algo extremamente vulnerável é incrivelmente corajoso. É preciso coragem para escrever o que todos estamos pensando, mas não conseguimos dizer em voz alta. Encontre isso em você e, em seguida, em suas personagens. Elabore maneiras diferentes que essas pessoas lidam com suas fraquezas e seus medos, escolhendo alguns momentos-chave para que elas sejam honestas. Afinal, o conflito no roteiro pode vir tanto da mentira quanto da verdade. 6. Experimente a Regra das Três Essa dica é sobre construção e timing de cena, já que a dramédia requer um malabarismo de ritmo bem complexo. “Eu sempre acho que deveria haver pelo menos três coisas acontecendo em uma cena ao mesmo tempo.” - Phoebe Waller-Bridge Uma cena sobre uma jovem encontrando-se com um banqueiro não é muito interessante. Mas quando a jovem está atrasada, completamente despreparada e suando profusamente (fazendo com que ela acidentalmente mostre o sutiã ao banqueiro em questão, que, a propósito, teve um problema com assédio sexual recentemente), a cena se torna instantaneamente mais atraente. “Eu sinto que quanto mais conflito você inflige em uma pessoa, mais real parece, porque caso contrário, é apenas uma conversa sobre um empréstimo bancário”, explica a roteirista. Seus personagens devem ser pessoas reais com problemas reais. E com que frequência nós simplesmente lidamos com uma coisa de cada vez? A vida é muito mais complicada e suas cenas devem refletir isso. Boa escrita! #roteiro #dicasderoteiro #dramédia #drama #comédia #Fleabag #PhoebeWallerBridge

  • Escrevendo como Tarantino

    O diretor e roteirista Vitor Mafra se inspira nos roteiros de Quentin Tarantino para falar sobre gênero, voz autoral e construção de cena Estudar roteiro também significa estudar o trabalho dos grandes mestres do cinema. É a partir das suas obras que entendemos muito sobre técnicas, efeitos e estilos que marcam gerações e ganham o coração do público. É exatamente essa a premissa do curso “O Roteiro no Cinema do Tarantino”, ministrado pelo professor, diretor e roteirista Vitor Mafra, que nos contou um pouco do que vai rolar no curso e o que podemos aprender com os roteiros de Quentin Tarantino. Além de dar aulas pela Roteiraria, Vitor Mafra também tem uma extensa carreira como diretor e roteirista, assinando títulos como a série de TV “Zé do Caixão” e o longa-metragem “Lascados”. Durante o papo falamos sobre voz autoral, construção de cena, combinação de gêneros e muito mais! Quem é Vitor Mafra? Vitor Mafra começou sua carreira na MTV em 1990, como editor e posteriormente diretor das criativas vinhetas do canal. A experiência em televisão o aproximou do diretor Fernando Meirelles, que o contratou como assistente. Foi diretor na O2 Filmes por mais dez anos. Lá, produziu e dirigiu seu primeiro curta: “Entre Tuas Rodas”, exibido em festivais nacionais e internacionais. Em 2010, co-dirigiu com o diretor Eric Lenate a montagem brasileira da peça “Celebração”, de Harold Pinter (Prêmio Nobel de Literatura). Em 2013, rodou seu primeiro longa, “Lascados”, atualmente disponível no Netflix. Entre os mais diversos trabalhos para a TV, criou, escreveu e dirigiu a aclamada série, ‘“Zé do Caixão” (Canal Space/Turner) com Matheus Nachtergaele no papel do ícone do terror brasileiro. Sua recém lançada série documental “Milton e o Clube da Esquina” é atualmente um dos programas de maior audiência no Canal Brasil. Vitor se especializou em criar, roteirizar e dirigir séries ficcionais e documentais, colaborando com os mais importantes players e produtores do mercado. Após anos dedicados à parte prática do audiovisual, passou a integrar o corpo docente da escola de roteiro Roteiraria, com um ciclo de aulas em que analisa a escrita do diretor Quentin Tarantino. Sobre o curso Com uma carga horária de 8 horas de duração distribuídas em 4 aulas, o curso “O Roteiro no Cinema do Tarantino” foca principalmente na análise aprofundada de quatro grandes obras do autor: “Pulp Fiction” (1994), “Jackie Brown” (1997), “Bastardos Inglórios” (2009) e “Era Uma Vez em Hollywood” (2019). “A primeira coisa que vamos discutir é como se aproximar de um filme”, comenta Mafra, explicando a didática através das “camadas”. “Vamos colocando camadas, do externo para o interno. Primeiro analisamos o gênero, depois as personagens, então a estrutura narrativa”, completa. Cada obra do autor serve como verdadeiro case para debater ferramentas específicas que fazem parte do seu estilo: da combinação de gêneros e referências à cultura pop em “Jackie Brown” à forma como Tarantino altera o curso da história, como é o caso em “Era Uma Vez em Hollywood”. “Por fim, chegamos na célula. Ou seja, como funciona uma cena”, explica Mafra. Para o professor e roteirista, é no desenho das cenas que Tarantino brilha, mas muitos projetos acabam encontrando dificuldades. Mafra responde: “esse é um dos principais problemas que identifico nos roteiros em geral. Às vezes a pessoa tem ótimas ideias, sacadas, premissas boas… Mas quando você chega na cena, percebe que ela não tem ritmo, que ela não funciona”. “O Orson Welles que disse: ‘o filme nada mais é do que um desfile de boas cenas’. Por isso que a gente vê filmes com grandes ideias e uma super premissa, mas que não vão bem por causa das cenas, que podem sair tortas, sem energia para levar o espectador a querer ver a próxima cena”. - Vitor Mafra Qual é, afinal, um dos principais pontos dessa célula? No caso de Tarantino, os diálogos. São os inventivos diálogos do autor norte-americano que conferem profundidade a personagens secundários, expõem o tema com sutileza, dão maior vida ao universo como um todo e o principal, impulsionam o filme para frente. “Quando analisamos o filme, os pontos de virada, os pontos importantes, por fim você vai chegar no tema. Os bons filmes escondem o tema, os filmes ‘não tão bons’ mostram o tema lá na frente o tempo inteiro”. - Vitor Mafra Fazer uma análise fílmica de um roteirista com uma voz autoral tão forte quanto o Tarantino é um ótimo guia para “desconstruir o processo”. É como se você retirasse todas as peças que compõem aquelas obras para, então, entender de fato o que faz o motor da história operar. “Entrar na cabeça do cara, nas decisões que ele tomou, gera muito conhecimento”, resume Mafra. O estilo Tarantino de escrever Para Mafra, “Tarantino tem uma voz autoral muito forte que começa na própria escrita”. De fato, basta ler um roteiro do cineasta para entender o ponto. Vitor Mafra acredita que o ritmo das cenas e a grande riqueza literária exibida pela perícia do autor são grandes destaques que garantem uma leitura prazerosa de seus roteiros. “É fácil identificar a grande influência da literatura pulp americana em Tarantino”, explica Mafra. Como é transmitida essa voz autoral nas obras do Tarantino? Segundo Mafra, vai “desde o vocabulário, às gírias, jeito de dividir cena, blocar os movimentos em cena”. Acima de tudo, os roteiros do Tarantino exibem muito bem o tom do filme. Acertar o tom no roteiro nem sempre é uma tarefa fácil, mas é essencial na hora de capturar a atenção e o entendimento de quem o lê. “Tarantino abertamente já disse que para seus diálogos se inspira muito no Elmore Leonard, autor de ‘Jackie Brown’”, comenta Mafra, revelando um pouco do universo referencial literário de Tarantino. Nascido em 1925, Elmore Leonard foi um escritor norte-americano e roteirista conhecido principalmente pela qualidade dos seus diálogos, trabalhando em gêneros como western, suspense e thrillers muito focados em crimes. Para Mafra, certamente um dos melhores dialoguistas da literatura norte-americana. Com essa inspiração em mente, fica fácil entender que a referência vai muito além da imagem. Referência de estilo e ritmo para a escrita em si do roteiro é um bom caminho para construir cenas fluidas e prazerosas para o leitor. “A voz do Tarantino tá no diálogo, mas também tá no cabeçalho, tá nas rubricas, tá em tudo. Essa ironia e humor constante tá em tudo”, Vitor Mafra comenta sobre a voz autoral nos roteiros do autor. “O roteirista precisa achar sua voz. Em termos de formatação, claro que tem coisas técnicas importantes que todo mundo precisa saber, mas principalmente encontre a sua voz no texto”. - Vitor Mafra Isso significa que, na hora de escrever uma cena, você precisa pensar muito além das ferramentas de construção dramáticas. Você precisa pensar na construção da sua frase, como diz o próprio Mafra. “Não é só uma descrição da cena. Tudo é ritmo, tudo é intenção. Que verbos você vai escolher para aquela cena? Isso é muito mais importante do que qualquer regrinha”, resume Mafra, que lança um recado: “para quem escreve, essa intersecção entre roteiro e literatura tem que ser constante”. - Vitor Mafra O poder das cenas longas Muito além da combinação de gêneros e do conhecimento sobre a cultura pop espalhado pelo roteiro, Tarantino detém um domínio sobre a construção de suas cenas. Muitas delas, por sinal, são longas e apresentam mais de um vetor narrativo. Há muitas vezes ações paralelas que irradiam tensão, interrompem e comentam a ação principal. Cenas icônicas com unidades fortes, que impulsionam diferentes vetores. “São camadas e camadas de decisões por cena, que às vezes duram quase vinte minutos”, Mafra contextualiza, apontando que dentro de uma mesma cena você tem, por vezes, “grandes movimentos dramáticos, brechas surpreendentes, clímax, pontos altos e pontos baixos”. Ou seja, um organismo muito complexo. Para quem busca um caminho mais formulaico, uma cena de 4 páginas pode acender um sinal vermelho. Não basta escrever cenas longas, é preciso ter o domínio dessas nuances e diálogos poderosos para capturar a atenção do público. De toda forma, esse lembrete é importante, pois conecta com outro recado dado por Mafra: “a escrita é um bom lugar pra você se atrever, sair da sua zona de conforto”. Assim, concluímos que as ferramentas de roteiro devem servir à voz autoral do criador (e não o contrário). Aquela famosa premissa: “trate as regras como guias e não como verdades absolutas”. Mais do que isso, lembre-se de estudar e se amparar em elementos que vão além dos livros de roteiro e dos índices narrativos que bem conhecemos. Sua escrita é interessante? Você transmite o tom da sua obra através das palavras? Você conduz o leitor a entender o ritmo da cena e seus pontos de tensão? A palavra tem poder, afinal de contas. Use-a com sabedoria. Curso “O Roteiro no Cinema de Tarantino” Informações Início: 17/05/21 Carga Horária: 8 horas-aula (4 encontros) Quando: segundas-feiras Horário: 19h às 21h Programa: 1 vez/semana 2 horas/dia Para mais informações, acesse: https://www.roteiraria.com.br/curso/o-roteiro-no-cinema-de-tarantino/ #roteiro #roteirista #Tarantino #roteiraria

  • O roteiro na era binge-watching com Paula Knudsen

    A roteirista e co-criadora de "Julie e os Fantasmas" divide suas impressões sobre escrever roteiros de série para plataformas de streaming Com a entrada dos streamings no mercado, o ritual semanal de acompanhar sua série preferida é uma ação cada vez mais rara. No lugar disso, vemos plataformas lançando temporadas inteiras no mesmo dia, fomentando a já crescente prática de binge-watching. Afinal, você sabe o que é binge-watching? Também conhecido como marathon-viewing, binge-watching é simplesmente a prática de “maratonar” uma mesma série por horas. Essa ação, por si só, pode mudar completamente a nossa forma de absorver o conteúdo. Há uma diferença enorme entre assistir a uma trama semanalmente e “maratonar” diversos episódios de uma vez só. Além de influenciar a experiência do espectador, essa realidade deve ser considerada pelo roteirista na hora de escrever sua série. Para entender melhor como a prática de binge-watching influencia a escrita de um roteiro, conversamos com a roteirista Paula Knudsen, que tem experiência nos dois modelos de criação - grade televisiva e plataformas de streaming. Através de experiências e conhecimentos adquiridos durante sua carreira, Knudsen fala sobre estrutura, piloto, roteiro para novas plataformas e muito mais! Quem é Paula Knudsen? Entre suas experiências no audiovisual, Paula Knudsen já escreveu para Netflix séries como “Samantha!” (Temporada 2) e “Spectros”. Além disso, criou, para a Amazon Prime Video, a série “Sentença”, drama de seis episódios com lançamento previsto ainda para 2021. Knudsen também é criadora do sucesso “Julie e os Fantasmas” (Nickelodeon e Band), série indicada duas vezes ao Emmy Internacional. Em relação a formação, Paula Knudsen tem bacharelado em Jornalismo pela Universidade de São Paulo e um Master of Fine Arts in Screenwriting for Film and Television da University of Southern California através da bolsa de estudos Fullbright. Escrevendo para streaming x grade de TV “Quando a gente sai da ideia de grade, outras coisas se tornam possíveis. A gente pensa no tamanho ideal da nossa história, qual o tamanho ideal de temporada”, começa Knudsen, reforçando que embora as regras mudem com o streaming, há muito conteúdo televisivo que ainda segue uma lógica clássica de grade de TV. Vale lembrar que mesmo algumas plataformas de streaming apostam em lançamentos semanais para alguns dos seus conteúdos. “Antes a base era TV a cabo - com 13 episódios - e TV aberta - 26 episódios. O que acontece é que pra fazer 26 episódios você vai precisar de algum tipo de procedural. E ainda existe esse modelo, se você olhar”. - Paula Knudsen Para a autora, esse modelo de temporadas longas às vezes pode levar a alguma “barriga” no meio da temporada. Com a nova forma de lançamento dos streamings, Knudsen afirma que é possível “avaliar o tamanho certo da temporada”, no lugar de depender do procedural para preencher a grade estabelecida. Knudsen aponta as séries britânicas como inspiração: “nas séries britânicas há um ritmo que se mantém, são séries normalmente com oito ou seis episódios”, explica a roteirista. Agora, temporadas com menos episódios se tornaram uma realidade e os players estão cada vez mais abertos a essa perspectiva. Afinal, como Knudsen explica, “os players hoje querem um conteúdo que seja assistido muitas vezes”. “Quando a gente falava em TV, precisávamos encher um número de semanas do ano. Hoje em dia os players não estão tão preocupados com isso tanto quanto ter um produto que todo mundo vá assistir”. - Paula Knudsen Em tempos de streaming, quanto mais sucesso uma série faz, maior o número de assinaturas. No lugar de cobrir uma agenda de programação para um período inteiro do ano, o roteirista, hoje, é desafiado a pensar no melhor tamanho para o seu projeto, entendendo os artíficios que podem levar ao binge-watching. Escrevendo um piloto na era binge-watching Se antes o roteirista precisava apresentar todas as personagens e todo o set up que vai levar ao desenrolar da trama logo de cara, hoje a lógica é um pouco diferente dependendo da plataforma. Segundo Knudsen, “muitos pilotos ainda fazem isso, mas hoje algumas reviravoltas você pode deixar no cliffhanger e retomar só em um segundo episódio”. Aqui, o efeito page turner se transforma no “clicar no próximo episódio” e seguir acompanhando a série. Para contextualizar esse novo modelo, Knudsen cita o exemplo da série “True Detective” (HBO), que atende a uma estrutura mais próxima a de um “longa-metragem”. “Isso nem é só pelo binge-watching, mas vem das pessoas assistirem a séries de uma forma diferente”, Knudsen completa. O que estimula essa mudança na forma de pensarmos o piloto? Knudsen afirma que há uma grande oportunidade de apresentarmos nossas informações “a conta-gotas”, mantendo o mistério e o engajamento que leva idealmente a pessoa a clicar no próximo episódio. “Tem aquela questão anterior ao binge-watching, que é a ideia do video on demand. Antes você precisava dar muita informação para ver se a pessoa voltava a assistir a série, quando passava sempre no mesmo horário, uma vez por semana. Então às vezes o piloto ficava carregado de trama. O que você quer vender hoje em dia são as personagens. Você quer que o público volte porque se apaixonou pelas personagens”. - Paula Knudsen Diante disso tudo, é preciso também considerar importantes contrastes entre o mercado audiovisual brasileiro e o hollywoodiano. “O mercado americano vende pilotos. O primeiro episódio apresenta a clareza dessa história e o quão interessantes são as personagens”, comenta Knudsen. O papel do piloto na hora de vender o projeto Para a autora, quando o roteirista tem apenas a bíblia do seu projeto, dificilmente ele vai conseguir transmitir a voz de suas personagens. Como sabemos, são as personagens que estão no centro de interesse dos players. “Você até pode ter as personagens na cabeça, mas é na hora que você começa a colocar no papel que elas vão te fazer perguntas”, resume a roteirista. Paula Knudsen reforça o papel da construção do piloto para a criação de complexidade do universo e das personagens: “a partir do piloto eu começo a anotar coisas para a temporada”. “Aqui no Brasil se vende muita bíblia para canal. Uma das coisas que fez a nossa série [“Sentença”] ser comprada pela Amazon sem uma produtora grande envolvida foi que eles gostaram muito do piloto. O que a produtora executiva levou para eles era uma bíblia e o piloto escrito em uma versão já avançada”. - Paula Knudsen Knudsen dá um importante recado para os roteiristas: “se você estiver escrevendo só a bíblia, você não está treinando roteiro”. De fato, principalmente para montar salas de roteiro, produtoras pedem cada vez mais um exemplo do seu trabalho. Esse exemplo, afinal, é um roteiro escrito. Se você tiver um exemplo de roteiro que denota sua voz e sua perícia como profissional, você certamente estará na frente. Perspectivas do mercado brasileiro “O que eu sinto falta do mercado brasileiro é o roteirista pensar assim: eu estou trabalhando nessa sala aqui, mas eu vou guardar um tempo para ir trabalhando nisso daqui que é meu”, reflete Knudsen. Parece simples, mas muitas vezes essa lógica é esquecida: para treinar escrita de roteiro é preciso… Escrever roteiro! Segundo Knudsen, um começo é ter um grupo de roteiristas que estejam mais ou menos no seu nível. Além de trocar páginas com pessoas próximas da sua realidade profissional, um grupo de roteiro também ajuda na hora de estabelecer metas e fôlego para seguir escrevendo. “Se você escrever 5 páginas por semana e seu objetivo é ter um piloto de comédia, em praticamente 5 semanas e meia você chega em uma primeira versão do roteiro. Quer dizer que se você pegar um pouco mais de 3 meses, você faz 3 versões”. - Paula Knudsen Para a autora, há também um grande apego por parte dos roteirista ao fato deles “terem uma boa ideia”. A essa questão, Knudsen acrescenta perguntas essenciais: “mas como essa ideia acontece? Qual é a voz da sua personagem? Na hora que você vai escrever é outra conversa”. O que fazer para entender melhor essas novas possibilidades estruturais? “Vale analisar e decupar episódios de séries que você ache que tem um clima bom. Ver as possibilidades que estão explorando e assistir às séries com isso em mente”, responde Knudsen. Escrever roteiros e estudar as séries que você gosta são duas ações que devem seguir lado a lado. Com o binge-watching e novas formas de consumir audiovisual, novas oportunidades narrativas nascem. Como roteirista, você tem a liberdade de fugir um pouco do procedural e experimentar estruturas diferentes, com temporadas mais curtas que concentrem melhor o potencial de produção. Ou seja, há novas possibilidades no horizonte criativo. Possibilidades que dependem de você! Tem um projeto na gaveta “esperando a hora certa de começar”? Lembre da dica: com 5 páginas por semana você tem um piloto em um pouco mais de um mês. #roteiro #roteirista #audiovisual #bingewatching #série #streaming #entrevista

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